sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

Memória e enjoo

Lisboa é uma terra tão extraordinária que, depois, mais tarde, quando veio a República, apareceram várias pessoas gabando-se de que tinham entrado no regicídio.
Raul Brandão

Que um governo escolha a neutralidade entre a homenagem e o crime, proibindo a força armada de prestar honras a um Chefe de Estado assassinado, define-o, como definidos estão os governantes da Acalmação, quando proibiram o desfile diante dos corpos do Rei e do Príncipe Real e contemporizaram com as romagens aos túmulos dos regicidas. As desculpas são fáceis de arranjar, mas são dos que pagam pouco e mal: "prevenir ofensas ao cadáver, evitar excitação que derramasse sangue...". Num caso e noutro, medo de usar a polícia para o que, afinal, deve servir.
Que naquele tempo houvesse demasiados admiradores dos criminosos e hoje apenas uma vintena mal contada, nada diz de emenda das gentes, apenas dá conta do ensimesmamento delas.
D. Carlos foi vítima de ter acreditado poder regenerar os partidos fazendo-os rodar, ao abrigo de uma leitura interventiva do Poder Moderador. Como Soberano, apesar de Lhe reconhecer a obra diplomática, não me é especialmente simpático, tanto pela minha fé Legitimista, como pelo anti-clericalismo que também abraçou. Nunca O serviria, mas jamais me alegraria com a morte Dele, como fizeram, arrastados na voragem do tempo, alguns outros.
O Filho foi, nos seus poucos anos, o símbolo da própria fidelidade: em 1907 ficou representando a Coroa e, numa récita no teatro D. Amélia, aos inimigos paternos que O aclamaram como D. Luís II, terá chorado e dito:
- Como me julgam capaz de por uns vivas atraiçoar meu pai? Que Deus lhe dê muita vida!
É tempo de acabar. Com o colchão do Arsenal da Marinha em que depositaram os restos moribundos da Vítima, fica a imagem da prostração de Portugal, só momentaneamente resgatada por um Génio que, posteriormente, passou. Hoje, sem Trono, cada vez vejo menos governo, salvo se por isso se entender a delegacia de poderes supra-nacionais. Que condiz perfeitamente com a receptação dos proventos das balas do Terreiro do Paço.


18 comentários:

-JÚLIA MOURA LOPES- disse...

Uma an�lise muito honesta e racional, sem ser desprovida de emo�o culminando no desencanto que a Cristina sintetizou em cima.

Mente quem diga que o Amor aos Ideiais � cego. Em suma- gostei muito pela isen�o do rigor.

beijinho

-JÚLIA MOURA LOPES- disse...

vou linkar, se não se importar..

Anónimo disse...

É incrível e penoso ver como este governo, que se reclama impermeável a pressões externas, cede à gritaria de uma minoria jacobina que confunde um acontecimento HISTÓRICO com um acontecimento POLITICO, impedindo assim a participação das Forças Armadas nas comemorações do assassinato de um Chefe de Estado...

Uma vez mais, está demonstrado que, neste país, quem grita mais alto é quem tem razão...

O Réprobo disse...

Querida Júlia,
fico muito contente com o facto de ter gostado, dentro das limitações anímicas do Momento.
Claro que fico muito satisfeito e grato por achar as minhas palavras, pobres instrumentos de intenção que tenho a vaidade de considerar digna, sejam consideradas dignas de Tal referência.
Beijinho

Capitão-Mor disse...

"Hoje, sem Trono, cada vez vejo menos governo, salvo se por isso se entender a delegacia de poderes supra-nacionais." Nem mais, meu caro amigo...resta-ns o desencanto e a eterna divagação pelas brumas da memória.

O Réprobo disse...

Sobretudo, Meu Caro TSantos, quando um partido não tem pejo, condenando por vezes formalmente o acto criminoso, de se considerar depositário da herança dos que o instigaram e que com ele se congratularam.
Claro que esta partidarização das Forças Armadas me fez lembrar a hitlerização da Wermacht, quando, após o 20 de Julho, se substituiu a continência tradicional pela saudação do NSDAP, passe a incomparabilidade da natureza das duas situações em que as intromissões ocorreram.
Abraço

O Réprobo disse...

Meu Caro Capitão-Mor,
mas há sempre uma altura em que as pessoas se cansam e se revoltam. Esperemos que o que se seguirá seja no sentido certo.
Abraço

-JÚLIA MOURA LOPES- disse...

Querido Paulo,

Entendo que não deva espantar-se com este Crime à nossa História.
Em cada minuto, eles agridem o presente. Quem agride os valores do Presente,não pode respeitar o Passado. Não ter ilusões é uma defesa que nos tornará menos amargos.

um nojo,sim,estes ignorantes ..

bem querer

JSM disse...

Caro Paulo Cunha Porto
Gostei muito de ler este postal, ele retrata um aspecto pouco divulgado, que talvez não fosse traço do monarca, mas era concerteza feição do ramo liberal. Atentem-se nos casamentos, lembremos a dificuldade diplomática de Dom Carlos em ser recebido pelo Papa, quando se deslocou a Itália em viagem particular. No entanto, repito, não me parece que Dom Carlos fosse anti-clericalista. Sei que uma vez foi aplaudido no Campo Pequeno por ter cedido, num caso concreto, ao jacobinismo liberal. Também sou legitimista, como sabe, mas percebo o isolamento do Rei, num país de adesivos. Só por isso, merece o meu respeito!
Um abraço amigo.

O Réprobo disse...

Meu Caro JSM,
tenho presente a cedência que reporta, assim como não digo que cercado como estava, não tivesse atenuantes. Mas vou ver se desencanto, cá na biblioteca, a notícia de uma recomendação lesiva da actividade eclesial que Ele dirigiu aos Ministros que tinha.
Abraço na Fidelidade e na Amizade

Anónimo disse...

Touché, Caríssisma Júlia...

Paulo: a posição do tal partidozeco não me surpreende, tal como as contradições em que caem...O que me espanta é como é que o PS (e o Governo) se deixam ir na onda deles...Talvez seja a proximidade das eleições?...

Ah, e a partidarização das FA aparece naturalmente, se tivermos em conta os numerosos exemplos dos últimos meses...

O Réprobo disse...

Pois, Caríssimo, são as raízes republicanas dp partido. Não manifestar institucionalmente pesar por um assassinato político faz parte integrante da ética republicana.
O partideco, apesar da demarcação directiva, foi mais afirmativo, teve gente sua a fazer provocações durante a homenagem do terreiro do Paço. Quem sabe se entre os deputados governamentais não haveria alguns imaginando que estariam entre eles, se ainda tivessem vinte anos...
Abraço

Anónimo disse...

Ah, a famosa "ética republicana"! E esta gente consegue dizer isto sem se rir ou, pelo menos, sem corar...

"Quem sabe se entre os deputados governamentais não haveria alguns imaginando que estariam entre eles, se ainda tivessem vinte anos..."

De certeza que sim...E só não o fazem porque, agora, são políticos "de respeito". Que hipócritas! Cada vez mais me enoja esta corja toda! E, como sabes, eu até nem sou pessoa de "ferver em pouca água"...

O Réprobo disse...

Meu Caro TSantos,
pois sei e não fervas também nesta, porque ficou comprovado que foi retirada do esgoto.
Abraço apertado

Anónimo disse...

Sim, realmente não vale a pena...É deixar que isto apodreça de tal forma, que vá tudo pelo esgoto abaixo...Já esteve mais, longe, de qq forma...Tenhamos esperança!

O Réprobo disse...

Pelo menos o País assim gerido não deixa dúvidas de estar na fossa!
Abraço

Anónimo disse...

Com certeza. O cheiro que emana de certos eventos não deixa quaisquer dúvidas quanto a isso!

O Réprobo disse...

Pfffffffffff!
Ab.