quinta-feira, 5 de abril de 2007

O Complexo de Judas

"O que tens a fazer fá-lo depressa e sem demora" - Jo, 13, 27
Nunca uma fala do Salvador encontrou terreno tão fértil para adulteração fundada na duplicidade! A própria duplicação do nome Judas, no bom Tadeu e no Iscariotes expressa, convidava a reavaliar a Traição, como instrumento decretado pelo Senhor para remissão da Espécie. O mesmo raciocínio que levou alguns eruditos a queimar os neurónios para fazer corresponder à desconfiança popular de que o Diabo não é tão mau como o pintam a noção de Satan como colaborador da Divindade no castigo dos Condenados. Eterna fraqueza do Homem, que quer tanto aviltar o que lhe está acima, como elevar o que antes foi dado como a mais baixa condição. Pensando-se no meio julga, com a esperteza da atenuação das diferenças, elevar-se rebaixando, mas dependendo da caução que lhe possa ser dada pela elevação de réprobos piores ainda que aquele que escreve. Daí as reabilitações que tentam os literatos, como os periódicos descobridores de "Evangelhos de Judas", aspiração antiga de gnoses várias. O pior dos seres humanos tende a encarar como refractário à Humanidade todo o que pregue a consideração de uma acção do Homem como traição ao Divino. Daí que, tanto no mito de Prometeu, como na aventura adâmica que nos tramou, a tónica seja colocada na aspiração ao Conhecimento traduzida no roubo do fogo, ou na prova do fruto, passando para segundo plano o essencial da conduta criminosa - a tentativa de se igualar aos Deuses ou a Deus, por ambicionar a imortalidade, sem necessitar para tanto da naturalidade da condição, ou do Amor Total, O que está para além da dose estupefaciente que sacie o egoísmo. O mesmo igualitarismo que tudo quer integrar, Judas e o Demo à cabeça, qual preconceito para-hegeliano que faz da antítese parte componente do Bem, pela falácia suprema que é o Progresso.
Não admira que a ilustração de todas as entregas da Inocência se tenha concretizado no gesto que, especificamente desprovido de carga erótica, mais puro devia ser - o beijo. O resto, reabilitações que encontram terreno, sobretudo, nos adversários, internos ou externos, da Hierarquia Eclesial tenta a popularidade como desodorizante do fedor do imenso mal-estar que é a conclusão do ser pensante que se olha e não quer reconhecer desgostar-se.
Boa Páscoa.

2 comentários:

cristina ribeiro disse...

Caríssimo,
Dá-nos,e estou a ler este seu texto já na Sexta Feira Santa,um tema para muito reflectir,nestes dois dias que antecedem o que espero seja uma Santa Páscoa!
Beijo

O Réprobo disse...

Irmã em Cristo - que bem justifica o Nome-,
é mais do que recíproco o meu voto, por cima destes tempos em que o vendilhão de Jesus tem tão boa imprensa.
Beijo