segunda-feira, 16 de abril de 2007

...A Tumba o Leva"



Podia ser o fecho de uma sentença começada por "O que a TV dá...
Perdi ontem preciosas horas a ver o famoso documentário sobre a alegada descoberta do túmulo de Jesus e deparei-me com uma ficção de má qualidade. O melhor argumento dado para vender a tese de que aquele Jesus, ali sepultado com familiares, era Jesus Cristo foi a estatística. Nem me aventurando pelas inconsistências técnicas que apontam aos dados fornecidos, lembrarei que muitos dos grandes acontecimentos históricos têm uma base de probabilidades de partida infinitamente menor. O cálculo das ditas poderá ser aliciante para sondar o Futuro, indeterminável que se mostra à maioria, não serve para apurar o Passado, o qual participa de uma esfera de verdade, não já de possibilidade, embora possa auxiliar. E as declarações do expert que computou os elementos são docemente modificadas: quando ele diz que os nomes em conjunto são mais raros do que cada um dos elementos que o compõem o termo rarer é dado como rare. Claro que um Zé filho de uma Ana e de um João, com um tio António, é mais raro do que a identidade Zé, por si só considerada. Mas quem poderá concluir pela dificuldade de achar uma tal correspondência? E os nomes em questão eram suficientemente comuns para aguentarem a comparação. Em momento algum se toca no espanto que seria Naturais de outra região não serem sepultados, como era hábito, com o nome da terra de origem: nem vestígios de Nazaré, Magdala, etc., ao contrário do que acontece com o recipiente que recolheu o Simão que ajudou na Caminhada Final.
De resto, toda a história abana muito, ao recorrer a falsários estabelecidos, quer na recolha da patine, com o envolvido num "achado" adicional forjado para acrescentar aos Manuscritos do Mar Morto, quer ao inventar o "Túmulo de Tiago", já certificado oficialmente como impostura, estando o proprietário processado criminalmente por várias fraudes arqueológicas. Além de não ter desaparecido nenhum receptáculo de ossos, bem como de o que se tentou impingir como tal ter dimensões bastante diferentes das registadas.
Acresce toda a insuficiência na análise de DNA que a Arqueóloga portuguesa entrevistada no fim apontou. E, na tentativa de pôr na sepultura uma Maria Madalena, o esforço de aproximar - que nem se conseguiu fazer coincidir - uma menção grega, quatro séculos posterior, de uma inscrição aramaica desafia a lei da gravidade investigatória.
Por fim, o ângulo e o círculo, passados como um símbolo Cristão arcaico, quase esotérico, encontram-se frequentemente em muitos elementos funerários judaicos, conforme os bons catálogos mostram à saciedade. E que lógica teria uma religião perseguida inscrever um emblema do próprio Credo à vista das autoridades que atacavam os Seus enquanto vivos, ou perseguiam a memória dos mortos?
Se era só isto que havia para dar, vou ali e já venho.

6 comentários:

Anónimo disse...

Concordo em absoluto consigo. Quanto ao seu "vou ali, já venho", foi exactamente o que eu própria fiz e em boa hora. Deu tempo e retempo para, enquanto decorria o longuíssimo e fastidiosíssimo documentário (que inicialmente me havia prendido e bem a atenção), por ausência de provas conclusivas ou minimamente plausíveis (andaram sempre à volta do mesmo, não adiantando nem atrazando, dando a impressão de estarem a querer 'esticar' o documentário até ao limite do possível, o que de facto aconteceu. E já agora pergunto, porque é que estes ossários foram descobertos em 1980, salvo o erro, mas SÓ recentemente foram levantadas estas questões?!), dar uma saltada à 2: e deliciar-me com o programa do Prof. Hermano Saraiva, após o que e voltando à 3, verificar que não tinha perdido grande coisa. Antes pelo contrário, tinha ganho bastante, porque na 3 esteve tudo igual durante horas e na 2: reconforta-se-nos a alma escutar este Professor.
Os convidados estiveram muito bem, designadamente a arqueóloga que não conhecia. Quanto à menina Conceição Lino, tem um defeito do qual não se livra nem por mais uma: tem o péssimo hábito de interromper os convidados antes destes terminarem o seu raciocínio e esta sua monomania já vem de longe e em todos os programas que tem apresentado ao longo dos anos - mas não é só ela infelizmente, outros colegas há que pecam pelo mesmo, sendo o Mário Crespo talvez o mais notório neste particular. Não saberá ela que este procedimento denota má educação e uma falta de respeito atróz da sua parte, não só para com os seus convidados como também e sobretudo para com os telespecadores? A sua falta de ar, asma ou deficiente respiração - por falta da aprendizagem devida - na articulação das frases (pechas de que o colega Crespo igualmente padece, aliás), ainda seriam de somenos. O pior são os outros defeitos.
Cumprimentos
Maria

cristina ribeiro disse...

Começo por dizer que não vi o referido documentário,mas quando diz que se deparou com má ficção,tive a visão de uma praia cheia de gente a ler o novo best seller de Dan Brown,cujo título não consigo descortinar totalmente,mas que há-de ser alguma coisa como"O Mistério...";é a receita infalível para garantir vendas.
Agora a sério:cheira-me a falsificação,quase na mesma linha dos Protocolos dos Sábios de Sião".
Beijo

O Réprobo disse...

Caucionante Maria,
tem muita razão no que diz da demora, cheira a cozinhado por todos os lados. Sobre as entrevistas é mal que alastra, mas sempre direi que gostava que um dia um inquirido respondesse "quer dar também as respostas?". Já me fartei de rir quando uma outra entrevistadora despeitada achou por bem comentar o que o interlocutor tinha dito com um "é a sua opinião", fazendo-o responder "mas foi para isso que me pediu para cá vir, não foi?". O Prof. Saraiva, por muito que o queiram denegrir, tem a irrefutável vantagem de ter um tom de génio para o que se prropõe fazer. Quem ouve o programa dele não está, com toda a certeza, na disposição de ler uma tese de doutoramento sobre o tema, mas pode ficar depois de o ouvir. É um pouco como o que defende o Escritor Mário de Carvalho, a necessidade de uma subliteratura que crie leitores, que lá transitarão para coisas mais profundas quando estiverem rotinados. Agora, se se quiser entrar à leão com abordagens muito complexas de um evento histórico, a maioria dos telespectadores muda de canal para o primeiro concurso imbecil que encontrar.
Beijinho

O Réprobo disse...

Cercada Cristina,
não há razões para preocupação, parece-me que esses livros, na maior parte da gente, serão mais acessórios de toilette do que outra coisa.
A fundamentação científica da peça pareceu-me, de facto, insuficientíssima, para ser meiguinho.
Beijo

Anónimo disse...

Caríssimo Amigo:
É a esta hora tardia que venho comentar - de fugida - o seu excelente (como sempre) postal. A ilógica do programa, e as suas intenções pouco limpas eram tantas que não o consegui ver todo.

Quanto ao túmulo de S. Tiago Maior, não será preciso buscar muito: Santiago de Compostela é um local muito mais documentado do que estes vindos agora à tona.

Quanto a Santa Maria Madalena, que vão procurar em França, no Languedoc e na Provença, pois há muitas referências históricas à sua passagem e sepultura por essas paragens.

E o nefasto Dan Brown (para o citar) nem sequer sabia que grande parte dos frateres da Ordem do Templo vieram para Portugal, onde esta perdurou, com brilho ímpar, até ao Séc. XVI - por muito mais tempo e poder do que os modestos irmãos de Rosslyn .

Enfim, com «historiadores» destes que procuram «mistérios» mais ou menos chocantes, baseados num punhado de vento, apenas com o fito de fazerem dinheiro, mal vão os tempos presentes.

Assim, não seja «meiguinho» com eles, e continue o excelente trabalho, meu Amigo!

Um grande abraço.

O Réprobo disse...

Caro Carlos Portugal,
Como poderia ser meigo com deformadores que, da própria maneira escolhida para conformar a verdade deixam tanto por explicar, como a da natureza dos elementos, aparentemente tecidos humanos, que teriam encontrado nuns ossuários, para onde, como se sabe, só vão esqueletos, muito depois de os outros restos terem desaparecido? São tantos os buracos...
Deve ter perdido o passo em que desencantaram uma obscura menção de um regresso final à Palestina de Santa Maria Madalena... Pois não perdeu nada, estou em crer que se eu colocasse neste blogue umas linhas dizendo que a de Magdala e Jesus tinham passeado de mãos dadas, ora bem, na Ericeira, isso viria a ser dado como prova irrefutável da relação marital entre ambos.
Abraço