quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Orelhas na Terra

Alegoria ao Terramoto de 1755 de João A. Glamma Stroberle, Artista com vinte anos de aperfeiçoamento em Roma, ainda hoje mais querido no mundo Anglo-Saxónico do que no seu e nosso País, talvez pelas temporadas de residência em Londres e... no Porto.Ao arrepio do ensino oficial do Catolicismo, insistentes prédicas religiosas voltam a martelar serem os tremores de terra castigos divinos, com se o Outro Mundo tivesse vindo fazer umas férias neste. Hoje são os clérigos islâmicos do Paquistão e de Caxemira, mas no nosso continente os Metodistas dos Irmãos Wesley reclamaram-no abundantemente, tendo John elaborado uma verdadeira Teoria Geral do Terramoto como punição.
Na sequência do de 1 de Novembro de 1755 em Lisboa, que abalou meio mundo pensante e outro tanto incapaz de o fazer, generalizou-se mesmo aos Países da Religião Romana, à revelia das determinações hierárquicas, a ideia de sanção. Num processo de abstractização das culpas, até o inefável Rousseau veio a embarcar na onda, apesar de as encarar como castigo não tanto do pecado, mais da imprudência e da traição à naturalidade da vida, estigmatizando os nossos Avós por terem escolhido esta localização para Lisboa, e pela construção de casas, largando o tecto celeste, numa não-especificada alusão à literalidade bíblica que mandava não colocar nada entre o Homem e o seu Deus, preceito também invocado pelos missionários puritanos para proibirem as posições sexuais com a Mulher por cima, dando assim nome à que se permitia.
Invertendo o caminho na generalização da causa pecadora, um inflamado visionário um tanto ridículo, esse Gabriel Malagrida que se dizia um São João mais claro, veio pregar, contra as causas exclusivamente naturais patrocinadas pela propaganda Pombalina, a tese da pena terrestre, mas com atribuição concreta da responsabilidade aos vícios do poder absolutista e centralista, arrasador das elites e esmagador das massas, que o Valido de D. José projectava. Afastado da proximidade da Framília Real, a sua extracção Jesuítica, como a influência nos Távoras e nos populares da Outra Banda, marcou desde logo Os que, com um Duque de Aveiro não-alinhado nestas fantasias, viriam a ser as vítimas emblemáticas do tirano iluminado. O candidato a profeta, esse, para não dar o braço a torcer, deu o pescoço, alcançando o sacrifício que ambicionava na sua entrega e que fez o seu nome perdurar.

Onde o conteúdo útil da relação entre pecado e abalo sísmico se encontrou foi na exposição de muito crápula que andava encapotado: com as casas destruídas e os géneros a rarear, a pilhagem e a especulação subiram a níveis tais que foi preciso importar tropas da Província, como dessa Peniche cujo abarracamento foi perpetuado na toponímia lisboeta, seguindo-se um imparável cortejo de prisões, degredos e execuções. Mas a Divindade não meteu o nariz nesta imposição da ordem, da esfera do humano, por muito que queiramos dar ao vocábulo a conotação de clemência.

19 comentários:

Capitão-Mor disse...

Era bom que na actualidade, o povo lusitano desse provas de empenho e engenho como nessa época de catástrofe!

Terpsichore Diotima (lusitana combatente) disse...

caro Paulo
Essa coisa da mulher por cima do homem não ser bom por causa de que não devesse estar algo entre o homem e Deus é que eu acho digna de nota. Aaaaahahahhah.

É caso para se dizer se o homem se esquecera, no seu convencimento da sua própria grandeza, de se interrogar se o Grande gostaria de ter o completo do costado mais a parte trazeira da excelência para ele virados... e preferido-os de longe, ao correspondente dessa criatura vil e desalmada - a mulher...

De facto, não era longe dessas épocas a frequência da ideia de que é falta de respeito, voltar as costas ao Divino, ou seus símbolos.

Mas as preocupações com o Divino não eram do teor do respeito por Ele, mas sim por si próprio: a capacidade de ver as coisas pelo ponto de vista d'O Outro, em vez a partir de si próprio, não era o forte do homem, pois não?

Hahahah, nunca ouvira tal coisa, essa razão, é inesquecível e era inimaginável.

Terpsichore Diotima (lusitana combatente) disse...

caro Paulo
Essa coisa da mulher por cima do homem não ser bom por causa de que não devesse estar algo entre o homem e Deus é que eu acho digna de nota. Aaaaahahahhah.

É caso para se dizer se o homem se esquecera, no seu convencimento da sua própria grandeza, de se interrogar se o Grande gostaria de ter o completo do costado mais a parte trazeira da excelência para ele virados... e preferido-os de longe, ao correspondente dessa criatura vil e desalmada - a mulher...

De facto, não era longe dessas épocas a frequência da ideia de que é falta de respeito, voltar as costas ao Divino, ou seus símbolos.

Mas as preocupações com o Divino não eram do teor do respeito por Ele, mas sim por si próprio: a capacidade de ver as coisas pelo ponto de vista d'O Outro, em vez a partir de si próprio, não era o forte do homem, pois não?

Hahahah, nunca ouvira tal coisa, essa razão, é inesquecível e era inimaginável.

Terpsichore Diotima (lusitana combatente) disse...

Ia a escrever beijinho, encravou esta coisa e postou logo duas vezes... espero que não seja por nenhum pecado! :))

Terpsichore Diotima (lusitana combatente) disse...

Ai meu caro capitão mor, eu acho que o povo lusitano até daria essas provas todas caso isso acontecesse!

O pior é que o povo lusitano só está capaz de reagir e dar essas provas quando um estado equivalente de visível e física total perda tiver tomado forma e ele não puder dar nem mais um passo no agradável dia a dia da preguiça e da lei do menor esforço.

Isto é: o povo Lusitano não está nada convencido de que seja preciso fazer alguma coisa. E não sabe o que há-de fazer...

Anónimo disse...

Lendo estes seus dois textos,tenho aquela sensação que já tivera com a leitura de outros anteriores, de que eles funcionam para mim como um despertador da curiosidade,levando-me a procurar, na medida do possível, colmatar as ignorâncias várias que põem a descoberto.Acho que posso considerá-los serviço público :)
Beijo

Terpsichore Diotima (lusitana combatente) disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

Cara Terpsichore,
isto ficou um bocado incompreensível, realmente, porque quando comecei a escrever não havia ainda comentário nenhum,e, entretanto,tive de interromper, altura em que a Terpsichore escreveu:refiro-me à inspiração exploratória que os textos do Paulo têm sido numerosa vezes; por ex.no caso concreto, fui investigar quem foi esse Tycho Brahé, de quem fala no postal anterior.
Beijinho

Terpsichore Diotima (lusitana combatente) disse...

Obrigada Cristina
:) Agora é que ficou engraçado.
Sim, eu já compreendera, e daí que apaguei a minha pergunta a si, para não ter que me responder :) Mas já está. :)

Beijinhos

O Réprobo disse...

Mas sem as baixezas, Caro Capitão-Mor.
Abraço

O Réprobo disse...

Querida terp,
ena, que gratíssimo debate que aqui floresce, com a Cristina!
Pois foi esse o fundamento que muitos pastores calvinistas em África, mas também alguns padres católicos mais zelosos, usaram. Consta que as nativas desatavam aos segredinhos, encaramdo-os como uma espécie de prvertidos...

A máquina é execrável, mas ficou muito bem.
Beijinho

O Réprobo disse...

Querida Cristina,
o inventor do pêndulo era uma figuraça. Ernst Jünger tem um grande texto sobre ele. Acho que também lhe dediquei um postal no «...Misantropo...». A ver se o encontro, aliás ainda estou a dever um achamento de agulha naquele palheiro à Musa.
Mil graças pelo elogio, "Madrinha".
Beijo

T disse...

O terramoto de 1755 foi a prova provada que somos capazes de muito e sobretudo do mais complicado: reconstruir apesar dos limites que o medo e a natureza impõem. Quer isto dizer conseguir cumprir a esperança. No meu pragmatismo habitual este é elemento poderoso.
Profissionalmente presencio muitas vezes situações extremas de dor e perca atrozes. Espanta-me sempre a cacidade de regeneração.
Bj

T disse...

Ai ..era capacidade. Sorry.

O Réprobo disse...

Querida T,
pois, é o que nos faz semelhantes à cortiça, que não afunda de todo...
Mas tudo tem o seu lado negro, Pobal reconstruiu uma cidade e com isso arranjou capital de à vontade para suprimir a identidade e equilíbrio de um Reino.
Bjinho

T disse...

Mas isso tb fez o célebre Barão em Paris..A modernidade da época exigia essa perversão. bjo

O Réprobo disse...

Usso é que não comnpro, Querida T. Comprar um fatinho novo não pode significar hipoteca da Alma.
Bj.

T disse...

Eu não abençoo essa opção. Au contraire. Mas assim tornaram a cidade um espaço mais fácil de reprimir,segundo outros.
Bjo

O Réprobo disse...

Por repercussões do moral no físico e vice-versa, vou pegar-Lhe na palavra.
Bj.