quarta-feira, 30 de abril de 2008

Não Obrigado!

Lá por estes dois objectos terem o mesmo nome, não quer dizer que o monopólio da obrigatoriedade seja retirado ao segundo...
O novo partido nasceu torto. Não por ser mais um, o que bastaria, nem por ter uma sigla (MMS) que a princípio tomei por SMS e é tão dispensável como ela. Mas pelo abuso que consiste em propor um voto obrigatório. Detesto candidatos a qualquer coisa que procurem que lhes sirvam em bandeja de prata o que, por si, não conseguiram obter. Querem tornar pacíficos cidadãos como eu em vociferadores de impropérios, obrigando-os a esborratar os boletins com o que pensamos deles, para os invalidar? Aos boletins, a eles seria chover no molhado.
Se o voto for tornado obrigatório, mudo de nacionalidade. Será que os Papuas podem ficar em casa em dias eleitorais?

Semáforo da Tragédia

Como proliferam as ambiguidades, até num evento que deveria ser de sentido único, como uma tragédia! Nem me refiro aos inconclusivos desfechos que se prevêem para inquéritos versando insuficiências de inspecções e combate a fogos no lar de idosos ardido por umas passas incompetentes. Refiro-me à mensagem, a retirar, a qual aspirando a ser de um perigo acrescido para os fumadores poderá também, ao invés, publicitar o fumo: afinal, a involuntária e infeliz viciada tinha chegado aos 93 anos, mesmo soçobrando a esse hábito ameaçador...

Da mesma forma o conectável quadro de Dali, em duas versões: O Fumador Adormecido, dos tons mais quentes, poderá ser visto como a sinalização do perigo, mas também ilustrar o êxtase, enquanto que a luz tendencialmente verde da alternativa tanto dá para permitir a continuação na bête noire da ASAE, como sugerir a incapacidade de gozar.
Não há certezas alicerçadas em fumaça.

Bom Vento A Trouxe!

«Porta do Vento» faz um aninho nestas andanças. Devo dizer, curto e grosso, que contactar com a Ana Vidal, pela fascinação da Escrita, como pelo magnetismo da Personalidade da Autora, já teria feito valer a pena de me fazer blogueiro. A Passagem de Chamine que segue indica bem que aquela Casa é a Porta do Céu.Junto um poema de nada negligenciável autoria. Nele se prova, nuanceando o lema da Página da Nossa Amiga, que fechando a porta ao Vento, se pode também incrementar os conhecimentos pessoais. Porque esse possessivo soprador é o Nada, o rival de todos nós, que frequentamos a casa da Ana.
De Ted Hughes,

THE WIND

This house has been far out at sea all night,
The woods crashing through darkness, the booming hills,
Winds stampeding the fields under the window
Floundering black astride and blinding wet

Till day rose; then under an orange sky
The hills had new places, and wind wielded
Blade-light, luminous black and emerald,
Flexing like the lens of a mad eye.

At noon I scaled along the house-side as far as
The coal-house door. Once I looked up --
Through the brunt wind that dented the balls of my eyes
The tent of the hills drummed and strained its guyrope,

The fields quivering, the skyline a grimace,
At any second to bang and vanish with a flap;
The wind flung a magpie away and a black-
Back gull bent like an iron bar slowly. The house

Rang like some fine green goblet in the note
That any second would shatter it. Now deep
In chairs, in front of the great fire, we grip
Our hearts and cannot entertain book, thought,

Or each other. We watch the fire blazing,
And feel the roots of the house move, but sit on,
Seeing the window tremble to come in,
Hearing the stones cry out under the horizons.

terça-feira, 29 de abril de 2008

Ondas do Mealheiro

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O Sr. Ministro das Finanças foge com o dito à seringa, no que toca a descer os impostos. Porquê? Por causa dos submarinos há muito contratados e que têm, se não os cascos, ao menos as costas largas.
Foi sempre uma credível manifestação da riqueza dos povos o gasto com uma marinha de combate. Na ressaca do Ultimatum de 1890, fez-se uma subscrição pública para adquirir um vaso de guerra, o Adamastor. Claro que o pobre e desacompanhado navio não poderia fazer qualquer espécie de cócegas, sequer, à Royal Navy, mas ter pago uma embarcação, em todos os sentidos armada, aplacou as vaidades feridas.
Também Eduardo VII de Inglaterra perguntou certa vez a uma amante célebre se ela tinha reparado que o que lhe ofertara em jóias dava para construir um barco de guerra. A questão era impressiva, mas a resposta foi impressionante - e já reparaste que o que vazaste dentro de mim dava para o pôr a flutuar?
Por isso creio ter sido de uma premonitória genialidade esta ilustração Nave da Guerra, que o Mestre de Pádua, em 1472, fez, para enriquecer «De Re Militari», de Valturio: aquele escudo da direita não parece ter, pintado, um cifrão?

Que Loucura!?

O Manicómio de GoyaJerónimo de Sousa foi visitar o Júlio de Matos para contactar a realidade. Eu sei que não foi esse o sentido que ele quis dar-lhe, mas lendo a declaração como um acto falhado, dá-me gosto ver os Comunistas devolvidos a um dos seus traços mais simpáticos, o da crítica da alienação do Capitalismo, que é a insanidade em que outros nos forçam a mover-nos...

Laços de Sangue

Loth e as Suas Filhas de Giovanni BarbieriEmbora o incesto consentido entre irmãos passe por ser uma glória literária e alguns extremistas libertários apostrofem o mesmo comportamento, mas em geral, como o último tabu a derrubar, é no sexo entre Pais e Filhos que reside a reserva de repugnância das mentes menos subversoras, alheias a vanguardismos assim justamente amaldiçoados. Porque, apesar de ainda na década de 1950 haver uma tribo oceânica que não ligava a sexualidade à concepção, a generalidade das grandes culturas tem o sexo como origem da relação com os filhos, tornando-o impróprio para a continuidade dela. A proximidade paternal quer-se uma espécie de porta-aviões no lançamento para os perigos e alvos da vida, não uma proliferação concorrente e aprisionante deles. Por tudo isso é tão facilmente evitado o acto, mesmo nos muitos casos em que jovens Senhoras constroem a imagem do Homem Ideal com base no carácter do Pai que conheceram e estimaram. É muito mais frequente do que o que ocorre com os géneros trocados, sendo essa patente enformação a causa do sucesso muito maior da teorização do Complexo de Édipo, já que não remetia para atracções tão assumidas.
Neste episódio, porém, não há que teorizar. Quando o horror é potenciado pela coacção, o devido só pode ser castrar e matar. Má nada!

Caso a Caso...

Não foi assim há tanto tempo que se anunciou, com estrépito e triunfalismo, a construção de uma super-esquadra que viria a melhorar a segurança das gentes, substituindo a inoperacionalidade alegada dos postos dispersos, pois não?
Seria este o efeito pretendido, de deixar que em Moscavide estivesse uma concentração policial menos celebrada entregue a um agente solitário, de tarefas burocráticas encarregado? Quem pode ficar tranquilizado com a desculpa oficial de se tratar de um caso isolado? Isolado por já serem raras as delegações da polícia? Não se percebe que quando um grupo invade uma sede da PSP para surrar um queixoso não só se atesta a absoluta falta de temor e respeito pela Instituição, da parte dos agressores, como se infunde acsoluta falta de confiança no resto da População? Não é um exemplo, o negativo como o positivo, sempre um caso isolado?
Mas, por fim, julgo ter compreendido a reacção das autoridades. Decerto o membro da corporação indefeso teria o apelido Caso. E quiseram dizer que ele se encontrava sozinho.
Obrigadão, já tínhamos percebido!

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Tal Público, Tal privado

Esqueçamos o legalismo! Não releva saber se pode continuar a dizer-se mal-casado quem dissolveu o vínculo matrimonial. O que se deve fazer é atentar em que se enraizou já na População a ideia de o 25 de Abril ser a data por excelência emblemática de algo que correu mal...

Visão Urbanística

Sempre que há fim-de-semana prolongado é um ver se não te avias, na estrada. Pensando na ponte que aí vem, em termos de calendário, temo que, rodoviariamente falando, não haja ponte para ninguém.
Não seria avisado, planeando o Futuro, introduzir uma construção como a reproduzida, na travessia a construir proximamente? Ou acham que não funcionaria no sentido das taxas moderadoras, muito mais eficazmente do que qualquer portagem?

A Hospedagem de Roma

Mesquita, Feriado Árabe de RenoirO Enorme Charles Maurras pronunciou-se certa vez, com uma clarividència que hoje se reconhece, contra o entusiasmo pela edificação de uma Mesquita em Paris, antevendo os problemas que o fortalecimento reconhecido da Comunidade Islâmica poderia acarretar. Não sou tão radical, acho que não há inconveniente de maior em proporcionar aos Muçulmanos um local em que possam desenvolver o seu culto com dignidade.
Mas isso não significa que não se vigie. E é impossível dar razão ao responsável do movimento Tabligh Jamaat, desgostado da atenção que despertou das Autoridades e da Imprensa o encontro internacional promovido por eles, neste fim-de-semana. Quem não deve não teme.
O problema potencial não está em o grupo ser Islâmico, mas em se confessar proselitista num local de Fé maioritariamente diferente. Não se exige que em Roma eles sejam Romanos, mas há que acautelar, não se dêem todos ou alguns a abusos da benevolência dos anfitriões, os romanos que nós, para o caso, somos. Nenhuma repressão, muita precaução!

O Convidado de Pedra

Francisco Franco modelando o busto do Estadista, com Ferro a assistir
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Dia do Aniversário de Salazar. Estranho como um Homem com tão pouca biografia para além da dedicação exclusiva ao serviço do País, sacrifício da vida familiar incluído, desperte tanta curiosidade, com os escaparates das livrarias repletos de livros que Lhe tentam captar os mais diversos ângulos. Claro que o mérito é da grandeza do seu consulado. Imagina-se algum interesse equivalente pelas governações do Eng. Guterres e do Dr. Durão, por exemplo? As editoras não dão ponto sem nó. E a anunciada biografia não-autorizada do Sr. Sócrates, a sair brevemente, caso venda, repousará na esperança dos humilhados e ofendidos que muitos de nós vamos sendo, no sentido de descobrir pormenores sórdidos sonegados, cuja publicitação satisfaça inelutáveis aspirações vindicativas. A lenda negra da Longa Noite dá pouco a pouco lugar à descoberta de uma verdadeira paz estrelada, o oposto deste entardecer triste e vil.
escrevi o que penso de Salazar, faz hoje dois anos. Neste momento apenas quero fazer um voto, o de que o convite a essa Figura Maior para a festarola multipartidária se venha a revestir do carácter da imortal ópera «D. Giovanni»: interprete o Génio Político que se expressou no nosso Século XX o papel da estátua do Comendador, incitando esse donjuanesco Poder que tantas forças políticas vem seduzindo, sem se casar com qualquer, a mudar de vida. E que, jocosamente convidado para a mesa do patife, o possa arrastar para os Infernos que, na forma partidocrática, aqule tanto fez por merecer.

domingo, 27 de abril de 2008

Os Negócios da China

O Chinês das Gravatas, por Calderon DinisDo supra-sumo da qualidade aquisitiva, no postal anterior, para a erradicação dela, no que abordarei seguidamente. Devo dizer que sou absolutamente contrário a hostilizações de imigrados chineses, por causa das malfeitorias tibetanas, como começo a ver. E trata-se de uma comunidadade ordeira e laboriosa, que merecerá alguma vigilância apenas no sentido de prevenir situações de escravatura endógena, embora nada se deva fazer na maioria dos casos, em que ela é pactada.
Outro problema é o da concorrência que movem aos nossos pequenos comerciantes e da acusação que lhes é dirigida, de vender artigos abaixo do mínimo exigível. Tal como na questão das normas bruxelenses de higiene e segurança, tenho de concluir que o melhor processo de controle é a educação do gosto do público. Em última análise, a culpa é toda nossa. E não só por lhes comprarmos a mercadoria. É que na Lisboa pré-abrilina a actividade deles estava confinada à venda de gravatas, como se sabe o artigo de vestuário mais inútil que existe. Foi depois de a maioria dos homens ter largado o uso quotidiano desse acessório que eles enveredaram para outras traficâncias.
Diferentemente com algumas chinesas, as quais andavam a burlar os incautos menos bafejados com visão clara, em plena rua. Diziam-lhes que tiravam uns "bichos" que eles tinham nos olhos, devolvendo-lhes a limpidez do sentido ocular. Uma sobra dessa tendência para a fraude ainda me tocou, na pior compra que fiz, a uma asiática, uns anos atrás, no estertor do Escudo: adquiri-lhe um guarda-chuva daqueles que elas apregoavam é a mili, é a mili. Resultado - durou vinte minutos!
Mas isto é peixe miúdo, comparado com compatriotas suspeitos de verdadeiro crime.
Para enfrentar essa pequena ameaça, bastaria que voltássemos a usar regularmente gravatas. Afinal, já dizia Oscar Wilde, Uma gravata com um nó bem dado é o primeiro passo sério na vida!

Quando o Sabor Está Em Saber

Ando desde o Natal para Vos dar conta de um local de compras que é imperioso visitar, mas só agora resolvi certas incapacidades informáticas que me tolhiam: Os «Sabores da Linha» são propriedade de Pessoas Amigas, mas não é esse o factor que faz figurar aqui a publicidade à Casa, senão o orgulho que sinto em comprovar uma vez mais o esmero e o gosto que as minhas Amizades revelam.Quando não tiverdes ideia sobre um presente a dar, encontrareis aqui o refinamento sob a forma de doces, condimentos invulgares, vinhos e licores - para onde logo se virou a minha atenção -, pastas raras, tudo o que de menos comum imaginar se possa, trazido de recantos do País pouco alcançáveis na lufa-lufa destes dias, ou importado.

Fica mesmo ao pé da paragem de taxis de São João do Estoril, por sua vez contígua à estação da linha férrea. Vale a pena a visita, mesmo que não tencioneis comprar, pois os olhos também comem e o requinte recompensa a deslocação. Mas duvido de que o eventual Visitante não venha a ceder às muitas e fortes tentações...

Bem Bum!

Lidas estas revelações, o comentário por imagem vale muito mais que as mil palavras...

O Ingrediente dos Apertos

A Mão Verde de Michel OgierSenhores, o que eu gosto de Ivan Junqueira! Muito do meu culto por T. S. Eliot se deve a ele, que para mim é Autor das melhores traduções eliotianas para o Português, nunca me tendo atrapalhado qualquer diferença da ortografia em desacordo...
Mas também a criação pseudo-desvinculada que é o estro, como se pode ver neste poema.
A mão, a que escreve, é tudo isso e muito mais, porque, se passível de ser acusada de dissipação em ninharias, erros e desvios de uma linha fundamental, o certo é que veio também, verdejante de esperança, cortar a divisória que impunha o luto pela realidade, conferindo a explosão orgiástica de cor e esplendor da atracção dos corpos ainda pouco gastos. Toda a sua insuficiência a condenaria a escrever torto por linhas direitas, se considerada numa solitária medida. Porém, ao grangear olhos que lhe leiam o labor, como ao celebrar um Belo alheio, atinge a redenção que a aceitação espiritual faculta, centrando-se no desinteresse dos cultos de um egoísmo que, porque compartilhado, se bane - o do reconhecimento estético. É a adesão admirativa que reitera necessitar a dimensão salvífica sempre de Alguém que se sacrifique por nós.
Oiçamos o Grande Poeta Brasileiro


A MÃO QUE ESCREVE

A mão que escreve é aquela
que não pôde, inepta,
agarrar o que lhe era
devido nesta gleba:
glória, insígnias, troféus
e algo enfim que soubesse
àquilo a que, incrédulos,
chamamos vida eterna.

A mão que escreve é aquela
cujas linhas, babélicas,
descumpriam o périplo
que lhes previa a esfera
de um trismegístico Hermes,
e que, por dolo e inércia,
deixou perder-se a pérola
que arrancara do pélago.

A mão que escreve é aquela
que foi, além de réproba
e amiúde analfabeta,
muitas vezes canhestra:
urdiu frases sem nexo,
bateu-se em tolos duelos
e excedeu-se, sem rédeas.

A mão que escreve é aquela
que compôs alguns versos,
odes, canções de gesta
e elegias sem metro,
às quais ninguém deu crédito
nem ouvidos. Aquela
que ergueu um brinde aos féretros
de uma insepulta Grécia.

sábado, 26 de abril de 2008

Sabedoria P´ra Pular

Leio o ditado chinês Nunca fales mal da Mulher diante do marido. Não tem importãncia que fales mal do marido em frente da Mulher. E pasmo que isto possa ter sido considerado uma chinesice.É que corresponde plenamente à insinuação de duas noções bem ocidentais, de contornos imprecisos, mas persistência confirmada, mesmo com as alterações vividas contemporaneamente na estrutura do Casal: Ele não suporta ver diminuído O que escolheu. Ela está aberta a ver confirmada a pouca sorte que Lhe calhou. Digam-lhe cobras e lagartos do amante, mesmo naqueles casos em que coincida com o vínculo matrimonial, e verão uma leoa a defender a cria que é o maganão em que se investiu.

Ao Sabor das Viradeiras

Dia que se diz ter sido o da morte de Daniel Defoe. Já noutro lado falei das interpretações que lhe caparam a ironia, coisa que uma vida pública dúplice não fez senão favorecer. Queixava-se de que poucas pessoas, tanto como ele, teriam estado, alternadamente, nos píncaros ou na fossa, mas o certo é que foi fazendo por isso, ao desmerecer, com as transferências de campo sucessivas, quaisquer confiança e defesa firmes na e da sua pessoa. Justificou-se (e ainda hoje os admiradores o repetem), dizendo que procurou, em cada momento, o partido que melhor lutasse pelos seus princípios. Mas, é curioso, achou-o sempre naquele que se encontrava no Poder...
Fez escola, como todos sabemos. Embora a expressão vira-casacas, exprimindo uma realidade velha como o Mundo, lhe fosse anterior algumas décadas. Nasceu da contínua inversão da política de alianças do Duque de Saboia, Carlos Emanuel I, na imagem, que ora alinhava com a França contra a Espanha, ora se coligava com Esta, contra a Nação Gaulesa. Para maior conforto mandou confeccionar uma casaca a que hoje chamaríamos double face. de um lado branca, para os períodos de conluio com Paris, do outro vermelha, para as alturas de harmonia com a Potência Ibérica...

Voltando a Defoe, não conseguiu com a "adesividade" qualquer consideração dos grandes vultos das letras britânicas, de nenhum dos lados do espectro político. Swift, pelos Tories e Addison, pelos Whigs, referiram-se-lhe com desprezo, acentuando-lhe a agravante de escrever mal. Ao ponto de não podermos deixar de interrogar-nos se a sua «História Política do Diabo» não constituiria, igualmente, um episódio de jogo duplo. Ou não fosse o nome que mudou, de origem, Foe. E a quem é que chamam O Adversário, a quem é?
À atenção dos que seguem a vida pública portuguesa, que vai estando a abarrotar disso.

Vagas Para Uma Vaga?

Musa em Pleno Surf, autor incerto

Sou estranho à lógica do esforço individual em vista a conquistar o acesso ao Poder, para si. Mas, não gostando, percebo a lógica da coisa. No PSD é que se passa algo que de todo me escapa: O Dr. Jardim à espera de uma vaga que o carregue, tal como se dizia estar o Dr. Menezes a suspirar por uma onda que o devolvesse à crista de que a sua demissão o afastara. Que terá dado aos barões laranjas para, de súbito, passarem à aspirante condição de surfistas de vagalhões inspiradores, segundo o seu julgamento? Se as representações mentais, para mim tristes, execráveis, que os enquadram vivem do voluntarismo da disputa, não será demais pedir a papinha feita por movimentos colectivos pretensamente espontâneos que lhes poupem trabalho? Não é abusar da sorte ficar à espera da sétima onda?

Cavar a Língua

Ao ler esta parte do DN de hoje, vejo uma velha pecha linguística, a confusão das preposições sob e sobre, revestir-se da periculosidade acrescida que conferem as mutações dos virus. Normalmente o sob era obliterado, substituído por um sobre impante. Assim, sob suspeita, sob detenção, davam as "sobredades" que levaram Alberto Pimenta a uma crónica genial; cliquem para aumentar, qua a leitura vale a pena.Na peça em apreço verifica-se a inversa. A Autora fala em missões do alemão arrependido sob o território britânico. Após o contacto inicial, pensei que se tratasse de um sapador. Mas não, era homem da aviação. Até que se fez luz: para a Signatária do artigo, "missão" não era sinónimo de voo, mas de bomba tout court. E aí há que dar-lhe razão, pois as crateras deixadas pelos engenhos explosivos do ar lançados vão ainda mais fundo do que os buracos abertos no idioma.
Cratera de Bomba Com Flores de Otto Dix

sexta-feira, 25 de abril de 2008

A Honra e os Dias

Eu posso ser acusado de muita coisa, mas não de ser um rapazinho de má vontade. Juro que procurei a bom procurar uma qualquer razão para comemorar o dia de hoje, querendo contrabalançar o tema fúnebre que invadiu os noticiários. Porém só me saíam desgraças, fossse o Cromwell degolador de Reis e massacrador de Povos, como o da católica Irlanda, ou a primeira execução por uma guilhotina, de Reis degoladora e de Povos massacrante, no Terror.
Até que achei algo de jeito. Al Pacino! Bom, excelente actor. No melhor filme em que entrou, «O Padrinho», por bem que se desincunbisse da espinhosa encarnação de herdeiro mafioso educado para outro efeito, veria sempre a sua excelente interpretação ensombrada por as origens facilitarem a corporização italo-americana, o que faria fatalmente aumentar a sombra de Brando e a concorrência de De Niro, embora neste também a voz do sangue tivesse palavra a dizer. O seu melhor desempenho, todavia, localizo-o num filme que vai sendo preocupantemente relegado para o exclusivo conhecimento dos cinéfilos: «Serpico».
Assim, recorro hoje a outra instância, uma fita mais recente, embora com um ostensivo overacting. «Perfume de Mulher», com a cena do discurso final que comove sempre, pela mesma razão que cativava a oratória justificativa dos acossados heróis de Capra, a do triunfo da justeza e das cruzadas pessoais contra os arranjos de bastidores que perpetuam sistemas, influências e inverdades.
Mas há mais e não pode deixar de ser referido. A defesa da verticalidade que recusa as delações é uma mera modalidade do pleito pela Honra. E porque o próprio Tenente-Coronel cego o menciona, é também o que devemos a todos os Mutilados de Guerra, o de não sermos cúmplices de assinaturas de documentos degradantes, sejam os das transigências e composições que vergonhosamente premeiam, sejam das vergonhas transigentes que entregam de mão beijada ao inimigo terras nossas em nome de cuja conservação foram mortos um Rei, um Príncipe e tantos Portugueses de vária condição. Aquilo que mais se deve a Eles e aos Estropiados nem é tanto o montão dos olhos ou dos membros que perderam, mas a disponibilidade para lhes continuarmos o combate, até ficarmos absolutamente exauridos ou triunfantes. A tal que também foi obviada pelas assinaturas do opróbrio, desses filhotes dos que defenderam o ultra-colonialismo para ganharem as emoções que os guindassem ao Poder, fazendo-se instrumentos do ultra-entreguismo que lhes rendesse as palmadinhas nas costas para se sentarem nas mesmas cadeiras.
Nesse sentido há uma outra razão para este postal na data de hoje. Mas pela negativa.

Resposta Pronta

Desabafava eu, dizendo que queria ver pelas costas a Vitória de Abril e não é que esta Moça agiu em conformidade?Se Santo Ambrósio opinava que a letra mata mas o espírito vivifica, convirá reconhecer que o corpo também dá uma mãozinha...

Visto de Fora

Entretanto, a propósito da duvidosa efeméride, ignoro se terá chegado a ser editado este livro, que possuo em 336 páginas dactilografadas. São as recordações do Embaixador Belga em Lisboa, à data da instauração do regime vigente. Apesar de os factos serem mais do que conhecidos e de o Autor ter sido fiel executante da política oficial do seu País, de uma aliança formal minada pela crítica da nossa presença ultramarina, traz alguns pontos interessantes, como uma panorâmica dos principais diplomatas cá acreditados à data, informação pouco reproduzida, com crueza equivalente, das origens ideológicas dos jovens governantes que Caetano levou para o governo e a escassez de efectivos do MFA, como a acentuação do carácter de defesa dos privilégios de casta postos em causa por decreto marcellista completamente tosco, apesar da aspiração de justiça.
Paralelamente, dá-nos pontos de vista interessantes
- sobre a macabra questão de Wyriamu, acentuando serem os autores das mortes forças indígenas com um quase inexistente enquadramento de oficialidade da Metrópole, o que raramente é sublinhado, deixando no ar a possibilidade de conflito tribalista na sua génese. A reacção diplomática, de solicitar ao Governo de Lisboa que assumisse as suas responsabilidades, foi completamente diversa do tom grandiloquente da campanha de imprensa.
- salienta a autorização dada a Soares, indiciado de crimes de traição, de vir a Portugal, sem ser molestado, assistir aos funerais do pai, coisa que nenhum regime totalitário, a começar por muitas Democracias, faria com facilidade.
- dá conta de que a oposição à guerra de África grassava sobretudo numa burguesia pouco disposta a põr em perigo a pele dos filhinhos. Diz expressamente que nas famílias humildes o sistema de pagamento do soldo, metade ao recrutado, a outra à família, era vista como uma fonte de rendimento alternativa à emigração, apenas com dose de risco maior, o que, acrescento no epírito do passo citado, não assustava gente dura, habituada a perdas de colheitas e outras catástrofes.
- mostra como a aclamação popular dos libertadores do Carmo tinha tido equivalente ainda mais concorrido na saudação a Marcello, às antevésperas do golpe.
- num parágrafo memorável sobre Caetano, conclui que a sua vontade não estava à altura da sua inteligência. O que, na seráfica linguagem das chancelarias, quer dizer era um incapaz para a função.
Lá que merecia o livrinho em devida forma, merecia.

A Revelação dos Cravos

Nada como voltar aos clássicos, para evitar que as mediocridadezinhas nos perturbem. Em não gostando do Presente que nos deram, umas quantas linhas de bom e imorredouro recorte logo nos reconciliam com a Vida, algo maior que o nosso tempo. Acordado na predisposição de embirrar com a auto-congratulação florida do triste estado das coisas, de imediato uma poesia do Abade de Jazente me devolveu a boa disposição. Precisamente aquela que dedicou a um colega que andava de cravo ao peito:

Tendes o cravo no peito
O lugar impróprio é,
Pois se o tivésseis no pé
Era o lugar mais perfeito.
Não julgueis que o meu conceito
Vos faz a menor censura;
É só com doce brandura
E sem vos fazer agravo,
Dar-vos pancada no cravo
Sem tocar na ferradura.

quinta-feira, 24 de abril de 2008

Aleluia, Shirley!

No dia de anos de Shirley MacLane nada como rememorar uma séria candidata a melhor comédia de sempre, embora, para mim, esse papel caiba por inteiro a «Ball of Fire». Falo de «O Apartamento», de Billy Wilder. O menos provável dos candidatos a paralelo com «Casablanca»; mas há uma hipótese de o tentar, não suficientemente ensaiada, a saber o de resultar uma qualidade-extra da indecisão dos argumentistas. Onde, no mítico filme de Curtiz, Bergman pedia que lhe dissessem sobre qual dos dois, Henreid ou Bogart, "tinha de se apaixonar", na fita que hoje refiro só uma trintena de páginas do script estavam elaboradas no começo das gravações, por o realizador estar indeciso entre fazer uma comédia ou um drama.
A Fran Kubelik que a aniversariante interpreta é um resumo de muitas outros papéis que desempenhou, de ausência de exepcionalidade, reagindo às medíocres condicionamtes da vida, até se comover com a descoberta de um sentimento puro num homem que à partida não era o desejável. É uma actriz incapaz de muitos tons, mas que funciona bem no registo de se exibir ferida, como no de se reconverter, pela comoção. Por algum motivo a minha cena preferida desta obra nem é este excelente final, mas sim aquela em que Fred MacMurray, nem tendo pensado no presente dela, lhe dá dinheiro. Tendo-se começado a despir, perante a interrogação dele, com uma expressão mais do que magoada, responde como me pagavam, pensei que...
E para quem tenha como exclusivo ponto de interesse a discrepância entre o dito e o feito há a velha anedota de, estando a aprender a jogar gin rummy, nos intervalos, com os seus amigos Sinatra e Dean Martin, por chalaça, levantar quatro dedos, enquanto proferia um audível "três!". Como fez isso passar para a filmagem, muito crítico caiu na esparrela de ver ali escarrapachada a tese da duplicidade da Mulher, perante o embevecimento do Director, sempre pronto a encorajar extrapolações subtis que fizessem crescer o seu trabalho.
Toda esta descoberta, no entanto, ficaria comprometida com uma intérprete mais dominadora. Quer dizer, com uma presença sem a fragilidade sempre lutando pela sobrevivência de Shirley MacLane.

Vacina Contra a Cólera

Cólera por Le Brun

Afinal, este novo estudo facial vem mostrar que onde se queria ver patente uma ou outra Virtude Cardeal, fosse a calma e sábia Temperança, nas reacções ao andamento de um jogo de Futebol, fosse a Fortaleza de se dominar, não deixando que ganhar ou perder ponham o espectador fora de si, dão antes lugar à Cólera, expressão do Pecado Capital que é a Ira. Talvez seja esta percepção que torna os organizadores do circo renitentes a introduzir meios, ou simples auxiliares, electrónicos da arbitragem. Temem que sem o detonador de emoções violentas que é o erro arbitral, ou um imaginado sentimento dele, sejam menos atractivos os desafios a quem os procura para enervar-se, assim como aqueles casais que só conseguem fazer-se andar para a frente com recurso ao confronto permanente. E não falo apenas da vertente sexual, senão da da globalidade do interesse, digamos assim.
Porque, caso contrário, haveria um meio de minorar esta falta de propriedade reactiva - pôr as câmaras ligadas aos quadros electrónicos a focar as manifestações dos mais exaltados durante as jogatanas, não apenas as carinhas larocas nos intervalos delas. Como a falta de vergonha crescente ainda se não acha completamente generalizada, é possível que muitos se refreassem, ao sentir-se individualmente filmados.

A Gavidez da Situação

Leio este alerta contra a retracção em contratar Mulheres, por receios dos empregadores de que a gravidez venha prejudicar a relação laboral. Trata-se de um problema verdadeiro, mas corresponde a uma diminuição do estatudo de gerar vida que se encaixa um regime que concedeu a disponibilidade de matar um ser gerado, como nas ambições de carreira de muitas Senhoras, as quais põem o progresso profissional à frente da vocação maternal. Estes enquadramentos acabam por se pagar; e esta é uma das consequências.
Mas se quiséssemos aliviar um pouco a gravidez da gravidade, poderia dizer que a relutância patronal mencionada residirá em temer que os conhecimentos de informática na óptica do utilizador pedidos às candidatas acarretem este resultado, com grave prejuízo de acesso...

Com Paixão

De todos os Homens do 24 de Abril, S. Vicente de Paulo está muito longe de ser o menor. Antes, de três séculos e picos, de António Gedeão ter escrito na «Pedra Filosofal» que o sonho comanda a vida, tinha-o dito ipsis verbis este ex-escravo de um alquimista.
Nascido pobre, não se deixou numa primeira fase tocar pela alegria na pobreza dos Franciscanos que o educaram, tendo escrupulosamente cumprido os seus deveres sacerdotais para melhorar a sua situação. De cada vez que parecia consegui-lo um novo imprevisto o mergulhava em miséria maior, até que, depois da inspiração da passagem por Roma, haveria de ascender a Capelão da Rainha. Abdicar de uma notável liberalidade Desta em favor dos que mais precisavam acabou por ser o mais fácil da compaixão que a partir daí encetaria. Focando a sua acção nos doentes, os que tinham ainda menos que nada, logo resolveu, tocado por Bérule mas alheio ao misticismo Oratoriano, que dar era muito pouco, só dar-Se poderia contar. Assim nasceu a sua concepção de Serviço dos Pobres, a qual, beneficiando do contacto com a família Gondi, levaria não apenas conforto material, mas facultaria o bálsamo dos cuidados femininos aos que nem podiam sonhar com eles, através da mobilização de Senhoras de Boa Vontade nas Confrarias, antepassadas das Conferêncas de Ozanam e das posteriores Voluntárias da Caridade. Simultaneamente, veiculava a Assistência Maior, levando o Cristianismo militante a uma multidão de camponeses subevangelizados e despertando vocações sacerdotais numa época que também ameaçava crise delas.
Não se satisfez com o seu esforço. Pedindo a Deus que Lhe mudasse o humor seco e repelente, por um carácter suave e benigno, viria a transformar-se, após o encontro com S. Francisco de Sales, cujo feitio compassivo era unanimemente admirado. E daí à Santidade, aquele terrível passo a que ainda hoje não consigo deixar de ser estranho, a piedade para com os condenados às galés, ao ponto de tomar o lugar de um remador chicoteado, foi para Si um desenlace natural.
Talvez tenha pensado dizer tudo ao interrogar-se: se um homem se move pelo lucro, onde está a sua dignidade? Mas mais explícito terá sido Chesterton, quando envergava as vestes de campeão do Distributivismo, ao condenar os socialismos igualitários - Esses que insistem em dividir estrangulam as alegrias insuperáveis de dar e receber com o coração puro.

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quarta-feira, 23 de abril de 2008

Letra da Lei

Ora bem, a Fugidia mostrou-nos a Sua letra. Lá andei a escarafunchar em locais da casa a que pouco vou e achei este guia do carácter que nos diz:
1-Escrita inclinada para a direita (de quem lê) - sensibilidade.
2-Linhas direitas sem rigidez - franqueza, rectidão.
3- Maiúsculas tipográficas - inteligência poética na escrita comum.
4- Margens estreias - economia.
5- Letras médias - dignidade.
Reconhece-Se, Querida Amiga?

Declaração Bombástica

Hillary, vencedora na Pensilvânia, tinha pouco antes declarado que, presumivelmente no caso de um ataque persa, uma administração sua usaria o poder nuclear para destruir completamente o Irão. Corresponde este programa de Política de Defesa a uma ultra-desproporcionalidade, um salto qualitativo, em relação à doutrina do Equilíbrio do Terror em que crescemos. Ali ameaçava-se com a liquidação não-convencional de alvos dolorosos, porque áreas populosas, mas nunca se chegou ao extremo de proclamar a destruição completa de um grande país.
Quem lembre a eleição de uma corista de Las Vegas em 1957 como Miss Bomba Atómica, como o folclore de quase a vestirem com uma representação do cogumelo explosivo, poderá achar que o infantilismo destes passatempos, abstraindo da dor das vítimas, pode correlacionar-se com a ligeireza das opções políticas das Americanas. Embora tenham sido homens a lançar por duas vezes os tenebrosos engenhos, como se sabe.
Dentro deste pavor seria no entanto divertido ver muito filoayatollah nostálgico da comparativa moderação do Presidente Bush...

Estatura de Estadista

Volta a imprensa gratuita de hoje à carga com o tamanho exagerado dos saltos que Sarkozy usa para emparceirar bem com a Carla, referidos também nesta peça jornalística. Deixemos as desconfianças de despeito, é evidente apequenamento de um político reduzir os terrenos que pisa aos centímetros dos respectivos tacões. Mas tentemos arranjar qualquer confrontação útil para trazer a este candente tema. E, bem procurado, vê-se, pelo famoso retrato de Luís XIV por Rigaud que não se trata de coisa a que os Franceses não estejam habituados na chefia do seu Estado, mesmo em melhores dias. Como olhando para os artefactos que Bogart usou em «Casablanca», para ter uma medida ideal ao contracenar com Bergman, esta característica não é de molde a prejudicar a imagem pública...

Fumo Com Fogo

A Chama-Bebé de Nathaniel MeyerInterrompi abruptamente a postagem, por via de um acidente quase doméstico: o ecoponto, mesmo em frente da minha casa, começou a arder. Quando dei por ela, uma pequena chama saía do contentor amarelo, o dos plásticos, pela abertura. Chamei os Bombeiros, que não demoraram mais do que dez minutos, mas, nesse breve espaço, todos os três depósitos, mais dois caixotes de lixo próximos tinham-se consumido completamente, cortando momentaneamente a rua, pela fumarada negra que libertaram. E apesar de os peritos na extinção me terem sossegado, quanto à possibilidade de pegar à sebe do vizinho, por ela estar muito verde, soprasse o vento noutra direcção, não sei, não...
Para verdes o grau de desconfiança a que a nossa Comunidade chegou, as Senhoras passantes garantiam a pés juntos que era obra maldosa, totalmente voluntária em vista ao efeito, enquanto eu, o eterno pessimista, passava por ingénuo e confiante, ao admitir que tivesse sido uma beata inadvertida mas inadmissivelmente lançada para local indevido.
Fosse como fosse, parece estranho que se não ergam separadores de restos em material menos comburente. Será esta a opção de uma administração avisada?

Refúgios e "Balu-artes"

Dia do Livro, na precisa altura em que leio a magnânima referência a esta casa feita pelo Meu Amigo João Marchante. Elege ele as «Afinidades...» como o blogue que levaria para a ilha deserta, imagem que se costuma aplicar aos livros. Uma ilha ligada à net poderia continuar a ser considerada deserta? Não fará parte da definição dela o conceito de "isolada"? Pus-me a pensar na diferença que o bloguismo encarna, face à Literatura. Mas cheguei à conclusão de que não é tanta asim. Se a companhia blogosférica vive da actualidade, o convívio com os grandes espíritos redactores dos volumes estimáveis prescinde bem dela, uma vez que no isolamento insular o tempo como que se suspende. Sem contar com o facto de que quem preza muito as páginas impressas e encadernadas acaba por lhes encontrar a vida própria como viu Max Benheim, à esquerda.
Mas não é tudo, com a agressão continuada contra o indivíduo, visível ou informe, também os homenageados de hoje podem constituir a barricada em que nos entrincheiremos, último reduto da nossa sanidade, à maneira da construída por Buz Spector.

Uma tradição catalã estendida a toda a Espanha quer que a 23 de Abril se ofereça um livro e uma flor. Os primeiros estão nas imagens. Às minhas Leitoras suplico que aceitem este post como metáfora da segunda. Mesmo que, pela imperícia de quem a colheu, ela se apresente um tanto murcha.

terça-feira, 22 de abril de 2008

O Riso e a Noite

Leitura do livro de Maria Filomena Mónica sobre Eça. Tem as virtudes e as deficiências de uma biografia contada a alta velocidade, prende a atenção e vive, algo ingenuamente, do espanto da Autora por o seu Tema e respectivas relações não se sentirem, perante o veneno que pensa existir nas relações entre eles, quer dizer, por não terem uma susceptibilidade igual à da biógrafa.
Um passo merece hoje que o cite, por ser importante para a compreensão das constantes e linhas de força político-culturais lusitanas. É o extracto do discurso do novato Deputado Assunção, comentado por Ramalho e por ele enviado ao amigo, para Newcastle:
Ramalho anotava que «S. Ex.ª principiara por declarar que é homem novo, que não tem conhecimentos dos negócios públicos, que ignora as necessidades da nação, pelo que solicitava dos veteranos nas lides que o guiassem, a fim de poder com os seus companheiros chegar a salvo através das tempestades e dos escolhos deste oceano revolto ao formosíssimo porto, em demanda do qual há tanto tempo navegamos». Sempre enfático, Assunção ia por aí fora. Ramalho analisava a passagem em que ele versara a felicidade dos portugueses: «Com tal pátria e tal povo é realmente impossível que não haja ua satisfação geral e muito bem diz o Sr. Assunção quando, entre os unânimes aplausos do parlamento, S. Ex.ª exclama: "Descontentamento, se o há, está em plano tão inferior que não alcanço vê-lo com os meus olhos"». Eça e Ramalho podiam rir-se. Mas seria Manuel de Assunção e não eles, quem ascenderia a ministro.
Este naco de retórica acaciana na pompa oca e untuosa, como, diria, socrática na cegueira optimista que ignora o cansaço popular, prova que vem de longe o carácter catastrófico das imagens dos políticos, sempre tentados a meter água com o canto do oceano e conseguindo-o amplamente com a incompetência decorrente. Mas há mais: em Portugal, estava a passar o tempo em que os políticos, como em França, ainda hoje, acumulavam as letras com a governação. Breve viriam a nutrir uma desconfiança perante os poetas sonhadores e os críticos incapazes de construir, tão robusta como a que os Realistas viriam a dedicar-lhes, tentando derrubar pelo riso, ironia ou sátira que fosse, o reino dos filisteus. A separação haveria de atingir o zénite quando a ponta da lança que a nova elite intelectual tentou meter no Terreiro do Paço falhou rotundamente, asfixiada nos jogos de bastidores que todos eles desprezavam. Falo de Oliveira Martins. A partir daí o divórcio estava decretado, com a gente da Cultura mais frequentadora do Poder sempre a ser taxada de vender-se e os poderosos mais dados a chamar a si os criadores acusados de subserviência. O que ficou da troça superior com que os melhores espíritos do final de Oitocentos pensaram salvar-nos foi a longa noite da partidocracia que em três regimes nos tem mergulhado na apagada e vil tristeza de uma classe política iletrada e não mais eficiente por isso.
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Consummatum Est

Auto-Retrato Com os Objectos da Vaidade de David Baily

A explosão de crédito mal-parado relativa ao consumo mais não é do que o que se verifica nas épocas de decadência, a utilização do dinheiro que se não tem para a ostentação de bens não-duradouros que dêem a ilusão de um estatuto. Quando a Nobreza deixou de ter como desígnio principal o serviço militar do Povo e do Rei também foi criado o seu ramal dito de Corte, em que a pretensão de acompanhar minimamente o fausto de meia dúzia de famílias que o podiam pagar levou muito fidalgo pobretão a contrair empréstimos junto da agiotagem para manter o nível das suas casacas, comilices e perucas.
Da mesma forma com a Sociedade Burguesa: o recurso ao crédito, antes vocacionado para a expansão dos negócios, mais tarde estendido à aquisição de lares próprios, sempre com o fito do progresso familiar, descamba agora num rodopio de obtenção de dinheiro fácil, aquele que não se sabe como poderá ser pago, para saciar a sede de uma imagem melhor, através de exibições de compras evaporáveis em prazo mais do que curto.
É a passada larga para o desastre.
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O Véu Pintado

O Irão já não é o que era! Então não é que deixou de condenar feministas por se atreverem a integrar essa condição abstrusa, fugindo para expedientes laterais que penalizam a mera participação em manifestações? E abstendo-se de aplicar com zelo as penas corporais, suspendendo a sanção, isto é, transformando-a numa chicotada psicológica, em sentido muito mais verdadeiro do que o da demissão dos treinadores de futebol? Esta coacção mental é incaracterística, quase tanto é possível encontrar nas identificações policiais de manifestantes anti-socráticos no nosso País...

A Loucura do Elogio

Putti Nas Nuvens de Cristoforo Roncalli, Il PommarancioPretendendo moderar a embriaguês da vaidade que leva a apetência dos elogios, Erasmo de Roterdão escreveu sobre eles:
Quem pode felicitar-se pelos elogios que recebe, se Homero cantou as rãs; Virgílio, o mosquito; Glauco, a injustiça, Favorino, as sezões; Séneca, o Imperador Cláudio; e Luciano, o burro?
Poderíamos acrescentar: e Luciano de Samosata, a mosca, que, viva ou morta, parece agravar as coisas. Mas o que repugnou ao Grande Humanista, a fraqueza que pode levar a acreditar corresponderem os panegíricos a verdades, uma vez notada, poderá originar outra imperfeição - a rudeza que sacode as boas vontades testemunhadas.
A função que qualquer elogio deve desempenhar não refere a quem dele é objecto, mas a quem o emite. Se formos criteriosos e prudentes, saberemos analisá-los e identificar os merecedores de estima, aqueles que provêm de Quem nos queira transmitir afecto, enquanto que outros são meros assédios da lisonja.
Plenamente compenetrado de que o que me dirigiu a Cristina Ribeiro em comentário ao post anterior se situa no primeiro destes casos, o que me é gratíssimo, ofereço-Lhe - e a Todos Vós - estes Putti. Porque Ela já aqui confessou gostar dos anjinhos. Por Se ter dado (ocasionalmente) como Nefelibata. E pela suprema razão de as generosas palavras que deixou me terem levado às nuvens.

segunda-feira, 21 de abril de 2008

Inteligência de Facto

Leitura de um esforçado ensaio de Fidelino de Figueiredo, «Memorialismo e Voluntarismo», em que tenta imputar os males pátrios à alegada incapacidade de formular uma ideia mobilizadora da acção, por o espírito nacional ser pretensamente atreito a atentar simplesmente no já acontecido:
Saber é lembrar-se, como recordar é viver, no provérbio mais aliteratado. O bom conversador - tipo muito nacional - é o homem que conta bem, que recorda, que descobre antecedentes e se deleita no anedótico e no episódico.
E remetendo para texto de João Chagas, em nota reproduzido:
A inteligência dos portugueses, de resto, não se traduz em ideias. Quando pretendem exprimir uma ideia, contam um facto.
A tese parece ser uma alusão mais à deficitária especulação filosófica lusa. Mas será isto um mal? Nietzsche disse nalgum lugar que as convicções serão mais nocivas para a Verdade do que as mentiras. E parece indiscutível que a deformação da preconcebida visão que procure na observação e no estudo a mera reiteração do pendor em que se mergulhou é bastante mais perigosa do que o vício apontado.

Se não me hipoteco, ponto por ponto, à visão agregadora que Oakeshott deu, a partir de uma leitura de Burke, de todo um Pensamento Conservador, com a aproximação de teorias difíceis de conciliar, estou, todavia, plenamente de acordo com o alerta que dele se extrai para os perigos das ideias gerais programáticas na informação das acções governativas, ao arrepio da Experiência e Adquirido dos Povos.
Mas o que poderia ser uma salvaguarda nacional contra essa ameaça, caso a presunção de Fidelino seja correcta, é completamente neutralizado pela sede de imitação que sempre tem marcado a nossa Vida Política e Intelectual. Em vez de formular os grandes quadros mentais sistemáticos que abalam as vidas noutras Nações, importamo-las inteirinhas, pelo prestígio de as crermos novas e, se calhar, pior ainda, pelo estigma de não nos supormos capazes de (melhores) ideias. É a abstenção de joeirar que prescinde da peneira que separe o que não presta, para se rodear das peneiras de fazer como nos locais civilizados. Ontem o que era chic, hoje o que está in, só mudou a língua dominante.

Por uma coincidência que reputo significativa, faz hoje anos que Jean-Jacques Rousseau abjurou o Protestantismo, em 1728. Abandonou assim a intransigência do Calvinismo da Sua Genebra, onde a Predestinação fazia de cada indivíduo um suspeito de perdição, teorizando em seu lugar a bondade natural de um homem que nunca alguém viu. Do hiperjulgamento condenatório que torna a vida insuportável, na minha óptica, passou à absolvição apriorística que transforma a existência num regabofe ético que repugnará a qualquer mentalidade exigente. Mas por que caiu ele nisto? Por não apenas prescindir dos factos, como expressamente enuncia em «O Contrato Social», mas por ter igualmente afastado a consequência das ideias, porém as gerais, as duas grandes enformadoras que se ofereciam para o recolher, se não heterodoxamente entrado na nova Religião - as de Bem e Mal como possibilidades de cada indivíduo e a irresponsabilidade do juízo sobre a Humanidade como entidade colectiva, fora da acção de cada um dos seus membros.
E assim, percorridos os riscos que a abstracção e o concreto, isolados um do outro, representam para qualquer norteação afirmativa, podemos encontrar um sentido útil para a crítica do nosso Autor: um dos traços mais incontestáveis dos nossos patrícios é a cedência que essas grandes ideações morais protagonizam em muitos casos, perante a atenção aos acontecimentozinhos que os rodeiam: vendo como os que fazem trinta por uma linha se safam muita bem, cada desiludido pensa que deve deixar de ser tanso, pôr de parte as lérias em que tinha acreditado e fazer outro tanto.
E nesta capitulação ganha plena acuidade o título do livro de onde se colheu a reflexão que originou este postal.

Nus e Suplicante

Naked Lunch de Fred FolsomEsta revisitação que o DN fez do passado do Sr. Sócrates até abona em favor da coerência política do homem: ontem, como na actualidade, alimentava a sua carreira política do desnudamento dos compatriotas que lhe permitisse mendigar votos. Que pleiteasse pelo nu integral, nessa altura, contentando-se hoje em dia com o Estado de Tanga, nada mais é do que a recorrente verificação de um radical aos vinte anos adoptar bastas vezes a moderação, dos quarenta para os cinquenta...

"A Mãe Tinha Razão"

A Rainha Isabel e o Príncipe Filipe no anúncio do noivadoQuem leia o livro completo onde se contém a Lei de Murphy, encontrará, como um dos derivados, o título deste postal.
Vem isto a propósito da notícia de que, em mais um festejo do aniversário da Rainha Elizabeth II de Inglaterra, o que devia ser festa familiar se acha ensombrado pelos desentendimentos adventícios entre o Príncipe de Gales e a inefável Camila. Bem dizia a Soberana ao filho para que não casasse com ela, comprovando-se agora a inadequação da con(muita)sorte para o cargo e tendo-se perdido a oportunidade de fazer crescer a popularidade do Herdeiro com uma abstenção de voltar ao matrimónio, depois da experiência infeliz. Desconfio de que muita da fascinação exercida sobre este homem fraco por aquela mulher se devia à tentativa de desafiar o sentimento generalizado de rejeição dela. Triunfante, estabelecido o matrimónio pela teimosia, soltam-se todas as fontes de incompreensão que a cegueira da insistência toldava.
Esperemos que o Extraordinário Exemplo Real de sacrifício pelo seu País e de estabilidade no próprio himeneu não venha a revelar-Se igualmente certa quando defende o salto geracional para William na Sucessão do Trono.
Por agora, o momento é de felicitações por mais um ano de Dever cumprido.