sexta-feira, 25 de maio de 2007

O Dia em Que Revi Paris

Não, não é esta a cena arrepiante. É-o uma que a precede, quando Kinski pergunta a Stanton se quer que ela dispa a camisola, momento arrasador em que a finalidade de uma demanda única é respondida pela média interiorizada da abjecção mercantil. Mas naquela aqui passível de reprodução há outra coisa, a consolidação do que de inapelável tem o frémito, sem participar da intensidade dele. A ironia, se o riso fosse para aqui chamado, estaria em mais uma vez se desencontrarem as vontades dos que se tinham amado, ao fim colidindo, até numa perspectiva... funcional. Ele, recordando o que Ela não quereria lembrar e dando as costas para que o degradado presente lhe não entrasse pelos olhos dentro. Do outro lado, a tentativa de perscrutar o momento actualíssimo, sem que o espelho permitisse mais do que a devolução por demais conhecida da imagem do nada em que se tinha tornado. Tentativa evidente no homem de evitar repetição da mediocridade imediata e temida. Por muita luz subversiva que virasse contra si próprio, depois do reconhecimento, não haveria retorno, desde a guitarra inicial de Ry Cooder que sabíamos ser a solidão de Travis definitiva.
Exemplo da mais extraordinária capacidade de excitação do Sensível, apelando até a experiência que se não tenha igual no detalhe, mas que se revele susceptível de assimilação a todos os reencontros que seriam dolorosos, se a Dor não tivesse já tido a sua apoteose, unificados em espécie.
Foi e é a obra-prima absoluta do cinema Pós-Clássico, mais ainda do que o díptico angélico do mesmo Wim Wenders, porque humano, demasiado humano: «Paris, Texas».

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