sábado, 10 de novembro de 2007

Suspeito do Costume

10 de Novembro não pode passar sem que refira Claude Rains, nascido neste dia e mês. Ninguém pode reivindicar mais estar bem com Deus e com o Diabo, senão ele, que encarnou Ambos. Quem eram, com efeito, o Patrão do Anjo de «Here Comes Mr. Jordan» e o tentador de Muni em «Angel In My Shoulder»? Mas não pára por aqui a ambiguidade e o inesperado. Foi professor de Olivier e de Gielgud, sem que se tenha distinguido na tela em interpretações shakespeareanas, apesar de um César, contudo muito cinematográfico e nada devedor ao Bardo Inglês. Actor de palco com mérito, quem o recorda nessa vertente? Inglês até adquirir o passaporte americano, passará à História da Representação como insubstituível na pele do Comandante da Polícia de «Casablanca», no estereótipo de um Francês visto por olhos anglo-saxónicos.
E o Capitão Renault é o segredo da durabilidade de atracção do filme. Sem ele como contrapeso cairíamos na categoria do melodrama que, se deu obras sublimes, despertou também alergias consideráveis. Com o seu contributo, sentimos que o heroísmo está ao alcance dos menos talhados para heróis. Quem não se importar com os fins que determinam actos humanitários até nem poderá levar a mal a tentativa de obter favores de uma refugiada em desespero numa troca pela autorização de saída. A presença de espírito da resposta à ordem dos alemães de encerrar o bar do Rick, sob pretexto de se jogar, logo seguida da recepção dos seus ganhos conexos, estava meio perdoada pela assunção de ser um funcionário corrupto pobre. E ao dizer que Bogart é um romântico, sob a capa do cinismo, dá voz ao que todos queremos adivinhar, culminando na competência de matar o vilão para não turvar a limpidez do protagonista.
As interpretações da atracção, eventualmente do foro da sexualidade, por Rick, são esmiuçadas prospecções de críticos, não o que nós vemos. Nem o que queremos, que é compartilhar um pouco da escolha exemplar do que sacrifica o amor de Bergman. Somos afinal nós que ele faz prender.

7 comentários:

Anónimo disse...

Genial contestación de Bogart en Casablanca, a la pregunta ¿Por qué ha venido Vd. a Casablanca? ¡ A tomar las aguas.......pero me informaron mal......!

T disse...

Louis, I think this is the beginning of a beautiful friendship.
E é capaz de ter sido.
Bj

O Réprobo disse...

Meu Caro Filomeno,
e para além da geni,alidade dada pela aridez marroquina por todos mais ou menos conhecida, há a ligação propagandística a uma cena do final, quando Rains deixa a obediência a Vichy e deita fora, com um ar de grande repulsa, uma garrafa de H2O dessa esância termal. Ou como a dosagem de subtileza se pode harmonizar na acessibilidade da mensagem generalística, em tempo de guerra.
Abraço

O Réprobo disse...

Pois é, mas há logo os clarividentes do costume a quererem ver conotações de outra ordem. O que me parece uma subversão do espírito da personagem.
Bjinho, T

O Réprobo disse...

Fica então aqui o alerta e a remissão.

T disse...

Sim em Guionismo ou lá como se chamava a cadeira, andamos à volta da sexualidade do senhor numa análise do Casablanca. Parvoiçadas.
Bj

O Réprobo disse...

Eu sou adepto de deixar magem de liberdade considerável às interpretações. O regresso sempre a esta orientação é que me parece fixação que revela mais sobre os que a fomentam do que sobre as suas vítimas. É um dos males de muita escola psicanalítica, querer reconduzir cada indivíduo a um modelo.
Beijinho, T