segunda-feira, 17 de setembro de 2007

Faça Cabeleiras, Mestre André!

É extraordinário como a Opinião Publicada francesa se vem mostrando volúvel acerca de Ségolène Royal. Antes da eleição levou-a em ombros, ao ponto de negar a evidência da derrota no debate televisivo com Sarkozy. Daí para cá tudo de menos abonatório tem sido posto em evidência, o artificialismo da postura, o tornear das questões enquanto prepara uma resposta limpinha, as frases de circunstância para agradar, à vez, a fatias da Sociedade descartáveis do resto, o feminismo bacoco, enfim a quota de vazio. Mas tudo isto sempre lá esteve, como demonstra esta genial rábula pré-eleitoral de Florence Foresti. O que se passará para ser toda esta negatividade posta em evidência, esquecendo-se a parte positiva, a de uma política liberta dos tradicionais grupos de pressão socialistas, com o jacobinismo da retórica atenuado e os bordões da Luta de Classes eliminados?
Dos seus opositores assumidos, Strauss-Kahn e Lang alinharam, em graus diversos, com Sarko. Fabius, vendo o campo vazio, continua a repelente reconversão da boca para fora, transitando do estatuto do Socialista mais direitista de França para o de líder da ala Esquerda.
Resta Lionel Jospin onde sempre esteve. Mas esse é que é o (seu) mal. Anuncia-se agora a publicação de um livro, intitulado «IMPASE», em que diz ser a actual dirigente do PSF "uma ilusão" e "não ter as qualidades humanas e as capacidades políticas para vencer uma eleição presidencial". Sabendo-se como foi brilhante o desempenho eleitoral para o Eliseu do opinador, falhando a própria presença na final, contra Chirac, importaria dizer-lhe não vá o sapateiro além da chinela, como Apeles o terá feito (ne sutor ultra crepidam).
Mas há uma história que, pela proveniência e força da recomendação, assenta melhor :
Por 1760 um cabeleireiro francês de nome André dirigiu uma missiva a Voltaire, tentando o patrocínio para uma peça sua «O Terramoto de Lisboa», essse tema que, desgraçadamente, deu para tudo. Rezava assim:
"É um estudante, noviço na arte da poesia, que se aventura a dedicar-lhe a sua primeira obra, tendo-o sempre reconhecido por um dos nossos célebres, pelas pomposas obras que tem dado e dá à luz todos os dias. Eu julgar-me-ei feliz se quiser lançar um rápido olhar a essa pequena obra, favorecendo-a com a menor das suas lembranças. Faltaria a um grande dever se não confessasse que o reconheço por mestre. Se pela sua bondade se dignar favorecer-me, eu prometo que, livre de todo o receio, publicarei constantemente os seus louvores e testemunharei por toda a parte o quanto lhe sou devedor por ter aceite.".
Voltaire, divertido, respondeu com a frase cem vezes redigida Faça cabeleiras, Mestre André, o que não despertou no destinatário outra percepção que a de "o grande escritor estar a envelhecer, porque se repetia".
Correndo o mesmo risco, também eu digo ao político Francês: Faça cabeleiras, Mestre Lionel.

3 comentários:

O Réprobo disse...

A obra é «IMPASSE». O "S" omitido é a gralha habitual.

Macro disse...

Caro Paulo,

Foi um grande momento de representação política anti-política.

Ainda bem que foi para lá o Sarkosy, este ao menos embebeda-se em directo nas cimeiras internacionais após conversas bilaterais com Putin, na companhia das garrafinhas de Vodka

Um abraço, acompanhado dum outro post de evocação a Jean Baudrillard acerca da representação/simulação, de certo modo implícito na Mademe Segó...

Abraço
rui paula de matos
Macroscopio

O Réprobo disse...

Meu Caro Rui Paula de Matos,
a Foresti é espantosa e muito bem servida por textos que apanham as feaquezas e bordões dos políticos, veja-se o apelo aos jovens e a acentuação sem substância no "mot juste".
O Sarko tem sido um completo Elixir da Juventude para um País cuja política já fazia da decadência incapaz de se assumir o modo de vida.
Abraço