segunda-feira, 17 de setembro de 2007

Cabeça no Ar

Perto do acto inaugural da grande exposição dedicada a Arcimboldo pelo Museu do Luxemburgo, ocorreu-me ser o momento de falar da série dos «Quatro Elementos», de longe por mim preferida à da tetralogia das «...Estações». Isto porque, por muitos antropomorfismos que comovessem os Surrealistas, até o surrealista que há em nós, a representação sazonal redunda sempre em compêndio de naturalista que o Pintor Milanês ao serviço dos Habsburgos também parece ter sido.
Enquanto que nos constituintes do Universo a coisa fia mais fino. Foi preciso alguma ductilidade para transferir as flamas para uma cabeleira, por muito que os cabelos ruivos hajam preenchido os imaginários do Ocidente.
E a evidência dos frutos do Mar na ideação da Água obrigou á profundidade de não olvidar uma homenagem merecida à nossa Colega Miss Pearls,
assim como a alusão à Terra nos traz animais de olhos fechados, que mortos ou adormecidos, não têm maneira física de despegar os ossos do chão.
O que nos transporta à genialidade da procura da sugestão do Ar. Como pintá-lo? Recorrendo a perturbações dele, como furacões, reduz-se a Essência a "deformidades" atmosféricas. Se olharmos para a figura cimeira deste post, poderemos dar como não pequeno sucesso pictórico a indicação do caminho, em vez da própria imagem da coisa. As alimárias de boca aberta remetem-nos para a urgência da respiração, de que a vida sente a falta ainda antes da água, e sem possibilidade de substituição como os outros dois componentes da síntese empedocleana.
Mas é o pavão que dá a suprema nota de argúcia, porquanto descreve bem a soberba desmedida do Homem em querer pensar e aprisionar mentalmente, como classificar, o que se lhe escapa entre os dedos. Apesar de aparências em contrário, Anaxímenes foi mais modesto, pois, ao propor o Ar como Princípio Originário, o vocábulo empregue não se referiria ao puro, mas à neblina, o que é nada desprezível confissão das dificuldades de abarcar claramente o que nos envolve.
E, para aqueles que estejam já disposinhos a dizer que fiz um postal a partir do ar, sempre citarei Thoureau, quando dizia que nenhum mal há em construir nele os respectivos castelos, desde que se implementem por baixo as fundações. É ele que permite voos e do concerto com a solidez das bases dependerá muito do nosso equilíbrio psíquico.

2 comentários:

Anónimo disse...

S. Com uma pintura tão material ninguém consegue dizer que não pode viver do ar.

O Réprobo disse...

Meu Caro Rudolfo Moreira,
vão nisso, vão e será um ar que se lhes dará.
Abraço