sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Imagens da Leitura 13

A Leitura de Molière de Troy

A leitura partilhada é hoje, tal como foi ontem, propiciadora de fortalecimento das relações estabelecidas entre as pessoas. No entanto, perdido o hábito de a família se reunir para ouvir um dos seus ler, passou-se ao incremento do que já existia fora dos penates tranquilos que facilitam a assimilação. Hoje, quase exclusivamente, o intercâmbio das preferências literárias é mais um ramal do processo de progressão e conhecimento nas relações amicais ou amorosas. Assim, em vez de interpretar o papel da semente lançada no solo adubado da calma instituída, passou a ser o adubo - mas não o estrume - que ajudará a tornar fecundo um solo recém-adquirido. E nesta diferença vai residindo muito do fundamento de, fora do meio profissionalmente ligado ao livro, diminuir a capacidade de aproveitamento do lido, apesar dos progressos nominais da alfabetização. A instrumentalidade na solidificação de laços entre estranhos que querem deixar de o ser, por muito desejável que se evidencie, joga de forma diversa com as disponibilidades e expectativas. O proveito virá dos entendimentos que gere nas sintonias e atracções pessoais, em vez do entendimento facilitado pela atmosfera adquirida e menos dinâmica do lar. É a diferença entre um digestivo e um tempero.

Retrato de Uma Senhora

Ou o Confessionário ilustrado...

Escrito no Vento

Claro que sim, Dona T, no Oriente homem que usasse leque estava até a ostentar sinais de categoria social. Mas fui ver o que significa na linguagem dos abanos "propor um leque". Obrigado, muito obrigado, é mais do que recíproco!

As Ilusões das Aparências

Impressionadíssimo com a abertura demonstrada pela Júlia ML às mensagens que acompanham os cosméticos, atrevo-me a redigir umas linhazitas de férias sobre o tema. Todas as comunidades do Extremo Oriente se celebrizaram pelo seu uso consagrado, mas este é um âmbito em que não divergem de outras civilizações, conforme demonstra a reprodução desta maquilhada suméria. Mais, o recurso a tais artefactos e artifícios, para agradar, era, na Antiguidade, extensivo ao género masculino, nos últimos dois séculos restringido ao after shave , pasta de dentes, sabão e fixador. Quando, nos nossos dias, se dá como "adição da personalidade" um perfume está-se a sugerir a fragrância como individualização, dentro de uma roda estrita, porque é difícil pretender que uma marca produza em exclusividade, coisa aliás contraproducente em matéria de reconhecibilidade do estatuto emergente dos odores conceituados. Mas não assim na Judeia Antiga, em que Salomão, David e os seus ministros tinham, cada qual, o seu cheiro único, pelo qual esperavam ser precedidos, notados e identificados.
Na Assíria-Babilónia-Caldeia inventou-se a máscara de beleza nocturna. As más notícas para as minhas Leitoras é que essa garantia da juventude da pele era obtida à custa de untar o rosto com gordura de cabra, durante o descanso. Não farei piadas duvidosas sobre a influência que as conotações caprinas possam ter tido nas condenações puritanas posteriores.
Os Etruscos deram especial atenção às modificações e acentuações das linhas dos olhos, que eram famosos, pela intensidade e forma, em toda a Península Itálica. E Roma viria a fazer com este ramo o que fez com as religiões: incorporar e disponibilizar ao público todas as importações dos países com que contactava.
Há a salientar uma oposição curiosa. Na Grécia Clássica ricos e pobres eram pressionados a não comparecerem nas festas em honra de Niké ou de Minerva sem que tivessem tomado um banho perfumado. Já na Inglaterra Isabelina lavar-se era gesto suspeito, dando-nos as crónicas como uma higienista a Rainha, por insistir em ter uma banhoca de quatro em quatro semanas, quer fosse necessário, quer não. Mas os perfumes desfrutavam de grande voga e um dos votos pios que a Virgem anglicanamente Coroada fez, no leito da morte, foi o de renunciar aos seus.
Nas mesmas Ilhas, aliás, em época tida por pouco constrangedora, o Parlamento votou uma lei, de 1770, que permitia anular todos os casamentos que uma Mulher tivesse conseguido com o auxílio de cremes, perfumes, saltos altos e outras artes do Demónio. Para além de ser uma universalização da liberdade de dissolver o matrimónio muito mais ampla do que o divórcio litigioso de hoje, é de notar que a condenação da publicidade enganosa se direccionava para os produtos de beleza, no seu conjunto, não já para aqueles que prometessem falsamente resultados.
Concepções da Verdade variando pelas realidades em que se quer confiar, hoje o consumismo, ontem a Pessoa, no seu todo...

quinta-feira, 30 de agosto de 2007

Uma Chapelada!

A Imaginosa T achou que o desguarnecido alto da minha cabeça não se encontra luzidio o bastante e, Amiga fiel que é, tentou abrilhantar-me de qualquer forma e feitio. A atitude evidenciando tanta lata só poderia responder com a oferta duma laca. Mas, sabendo-A letrada, receei este resultado...
Ná, o melhor é mesmo um chapeuzinho, sobre o que já falámos, quer sejam as próximas umas férias costeiras, como em Lendo à Beira-Mar, de Charles S. Pearce,
quer fique pelas esplanadas, como em Leitura Agradável, de Hua Chen. Há é que não ser dominado pelo vento que corre, como não cessa de sugerir a moldura deste blogue.

Filosofia À Flor da Pele

Eis um anúncio artilhado. Propagandeia uma melhora do físico, apelando à capacidade especulativa, quer dizer, ao intelecto. Desde logo quando diz ser o ideal da (e não para a) pele. Como se esta se deitasse a conceber o que melhor lhe assentaria. Depois, por jogar com a associação do ineditismo da fórmula, assegurado pelo parêntese do texto, facilmente associável nos inconscientes em que pretende agir à mocidade que encanta. Mas, para sossegar os misoneísmos que estivessem alerta, o parentesis do cartaz indica o registo, logo, a aceitação etabelecida.
Entretanto, o melhor vem do jogo entre os nomes do produtor e as atitudes filosóficas perante a vida - ao garantir que interessará aos que compreendem a "beleza" como um factor importante da razão da existência, joga em vários tabuleiros. Apela ao primado da Estética, mas não negligencia o da Ética, pelas aspas que relativizam. E, para cúmulo, insinua-se junto dos que privilegiam a procura, quer nos que rumam à busca da Felicidade pacífica, com a graça Ventura, quer dos existencialistas, que premeiam a Angústia, através do apelido Pena.
À atenção de Duas Consumidoras Potenciais, a T e a Júlia ML

Imagens da Leitura 12

Eis o exemplo em que a T pôs os olhos para as férias que se avizinham...
Uma combinação alternativa que igualmente conduz à perfeição.
E, por fim, a razão de não temer a morte: não é só enquanto há vida que há esperança. Mas não é necessário descurar a alimentação, o que poderia acelerar o estado de coisas que se vê.

quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Banho d´Ouro

Deu-se hoje a Águia, ao entrar na Liga Dourada. Camacho faz a diferença, por enquanto não na escolha da linha, mas por ser um treinador que infunde ânimo, não um tímido sempre a sentir o perigo do pescoço apertado, enervando os jogadores. Apenas o vi desmoralizado numa circunstância; e que só abona em seu favor - aquando do comentário à morte em campo do Jogador do Sevilha, episódio que não tem cabimento no universo do jogo.
Hoje Katsouranis foi o melhor, não só pelo golo, mas pelo que defendeu, em lugar que não é o seu. Mas gosto à brava de Cardozo - salvou uma muito difícil e ajudou a marcar outra, dando água pela barba a uma defesa inteira. Houve algum leite à mistura, mas prefiro queixar-me dele do que do azar.

Imagens da Leitura 11

Requer o ideal que fazemos do Leitor que a assimilação da obra se equilibre entre a profundidade da interacção com o texto e a manutenção da dose de independência que se traduza na manutenção do espírito crítico. A pura cedência à devoradora sede de conhecer pode congelar o crescimento espiritual que se espera como proveito a retirar de um livro; tal como a Mulher de Lot se viu transformada em estátua de sal, por não ter resistido a olhar para trás, também aquele que apenas procure saciar ligeiramente o bichinho que o vai roendo pode ver-se metamorfoseado metaforicamente numa imobilidade solidificada em materiais perecíveis.
Mas há a pecha contrária: a do que ama tanto os livros que do que segue no papel faz sair a diluição da sua personalidade, fundindo-se inteiramente com o que por outrem foi redigido. Apesar de ser perigo contraposto ao estatuto de perfeição na Leitura, não deixa de inspirar o prestígio que, romanticamente, as grandes paixões ainda despertam. Sendo que aos olhos desses bibliófilos radicais ninguém, salvo os próprios, sabe amar a Escrita.
O Bibliófilo de Ernesto Montenegro

Ó da Guarda!

O Guarda-Livros Que Sonha Durante o Dia de Norman Rockwell
"Quem não quer ser guarda-livros?", pergunta bem a T. Ninguém, ao menos pelo que os pintores viram nas duas acepções da expressão. Num exemplo, o sonho que supera o ramerrão das contas diárias; no outro, a imanência que faz deitar contas à vida e... sonhar, contornando a abstracção que o nosso preconceito daria por incompatível!
Guarda-Livros de Courtney Fischer

Época de Saldos

Garantindo o contraditório face ao que a T escreveu, aqui está a prova de que a generosidade pode repousar em Preços com muita competência e que aguentam qualquer compita...

terça-feira, 28 de agosto de 2007

A Cabra Expiatória

Anda meio mundo a cair em cima da pobre Miss U S Teenager 2007. A coisa tem antecedentes, porquanto os naturais da Carolina do Sul são tidos como os parolos da Federação, um pouco como os franceses fazem os belgas. E, no entanto, a resposta da rapariga encerra virtudes: a da diplomacia, em vez de dizer o óbvio, isto é, que para muitos americanos os Estados Unidos SÃO O mundo, canalizou a falha para a desculpabilizante desmunição, um pouco como todos os fracassados que se desculpam com as dificuldades económicas do meio em que nasceram. Com uma diferença, ela estava a desculpar os OUTROS.
O resto não lhe deve ser imputado. É uma variante da clássica pena pela fome, guerra e analfabetismo no Mundo. Sede de consensualismo que só peca pelo vago que tem, neste, como noutros casos. Disseram-lhe para manifestar preocupação com a situação do Iraque, da Ásia, da África do Sul (o ponto dela devia ter pouca noção do desenvolvimento do país homónimo) e que expressasse o desejo de ver os States ajudarem as nações com sistemas educacionais mais insuficientes. Foi o que a gaiata fez.
E, que diabo, Colombo nunca poderia apontar o território da União no mapa, justamente por não ter um, embora haja ficado com os louros da descoberta do continente, ao arribar a umas ilhas...
A jovem é uma Boa Americana.

O Embaraço da Escolha

Madame Ginoux com Livros de Van Gogh

Ou a Senhora retratada interpretando premonitoriamente a indecisão da T sobre a leitura a levar para férias..

Salada Russa

Estou piurso, pior do que urso: nunca pensei vir a dizer que me tinha sabido mal o acompanhamento que titula o presente. Mas o certo é que esperava, quanto ao quadro de medalhas dos Mundiais de Osaka, ter Nadie a acrescentar e fiquei com... nada a acrescentar. Estas Meninas, Lebedeva, Kolchanova e Kotova, tomaram o podium todo para elas, o que deixa um travo amargo, porque, se a Primeira saltou acima do melhor que a nossa Atleta tem, as outras fizeram-no abaixo, mandando-a, de castigo, para o quarto. Saltos chatos e compridos, ou não fossem em Comprimento, embora mereçam um cumprimento. Como diria a T, Grrrrrrrrrrrr!

Imagens da Leitura 10

Mundos Escritos de Rob Gonçalves
O chamariz publicitário Vá Para Fora Cá Dentro, pensado para promover a preferência nacional das férias, sempre me pareceu atingir o seu alcance pleno se aplicado ao acto de ler, que transporte a localizações distantes sem abdicar do uso do que é próprio, admitindo que o leitor não tenha a sua massa cinzenta completamente adormecida. Como turistas no espaço geográfico acabamos por prescindir de parte de nós, ao escaparmos a rigidez que no nosso habitat, de onze meses em doze, nos impomos. É no trajar, é no falar, é na postura, sobretudo a dos pés, é no cuidado com os espaços públicos, é na alimentação. Não queremos dar conta, pobres de nós, de que a sede de conhecer os outros se acha comprometida pela adaptação sazonal das povoações à degradada condição que encarnamos, não funcionando com a normalidade e identidade da maior parte do ano, até pela debandada de metade da população, muitas vezes a melhor, que as descaracterizam. Procurar conhecer mundos diversos através do que lemos é muito mais compensador. Intensificamos as aplicações da atenção, não a dispersando, podemos contactar com o melhor que outras paragens produziram e inteirar-nos do que os olhos treinados, de dentro ou de fora, nelas viram mais digno de nota, quotidianamente. E não sentimos a necessidade de desligar o raciocínio, o descanso é fornecido pela variação do volume e focagem dos temas sobre os quais nos debruçamos. É a diferença entre torrar e procurar saborear.

segunda-feira, 27 de agosto de 2007

Coquetismo Versus Assadela

Para garantir a economia familiar, quando a precocidade senhoril se evidencia, potenciando a resposta dada pelo produto propagandeado pela T, já que a pele duplamente sensível tem de corresponder o reconhecimento dessa dobrada apetência.

Imagens da Leitura 9

Se há motivação que possa encarnar sempre o cerne da Leitura, ela é a curiosidade, essa ambígua motivação: péssima se aplicada à vida dos vizinhos, sublime se apontada ao Conhecimento e Sensibilidade que os bons livros transmitem. Mas há uma manifestação intermédia dela a que corresponde um pecadilho que aqui tenho de confessar: é o do vício horrível de ler por cima do ombro do vizinho do lado num transporte público. Não consigo resistir, se identifico um mínimo de interesse no texto em que o passageiro perto de mim se delicia. É mais do que mera incapacidade de ignorar quaisquer linhas impressas, trata-se de um exercício em que me rotinei inelutavelmente, o de apreender um pequeno grupo de linhas e, em função do seu conteúdo, imaginar a personalidade do que lê, fazendo corresponder aquela cativada e cativante circunstância à ideia que dele posso fazer, pela avaliação que a sua exterioridade e maneira me permitam. Perdemos muitas vezes de vista que um livro é um ser humano, exposto. Aquele que o abre, em lugares públicos, prossegue essa renúncia parcelar à privacidade, oferecendo à vista e juízo dos demais não uma obra, mas a sua vontade de ler uma. Tento, por conseguinte, reabilitar esta parte rude e insuportável da minha conduta com o mito de que procuro, em cada par mensagem/descodificador, aplicar alguma esperança na descoberta de uma cumplicidade de gostos, ou de uma espiritualidade poderosa e admirável. A qual correspone a aspiração ainda mais remotamente concretizável, a saber, proporcionar algum contributo à esfera intelectual de alguém com quem partilho um mínimo de gostos e ainda desconheço o suficiente. Tudo somado e conferido, uma foma mais da vaidade, já que Leitor colectivista pela omnipresença e sempre iluminante só o que a ilustração nos dá, nas costas do proprietário do volume...

Uma Já Cá Canta!

Que admira que me sinta na Lua? Não há em Évora um templo dedicado a Diana e esta não é associada ao Satélite da Terra? Pois o nosso Nélson Évora já abarbatou o ourozinho de Osaka e fez a bandeira nacional (a tal que é infeliz, mas esqueçamos isso) dar a voltinha de honra à pista. Tão novo e já com um capacidade competitiva rara! O record que estabeleceu no Triplo Salto é de 17,74m, marca mais de meeting que de grande competição! Penso que no momento só o grande Olsson se poderia medir com ele; e teria de esforçar-se.
No entanto, não quero deixar de saudar os meus Leitores Brasileiros, pela saudável luta que deu o enorme atleta Jardel Grgório, digníssimo sucessor do saudoso João do Pulo. Um podium a falar muito português. Perdoem ter infringido a regra de só postar recordistas mundiais ou continentais. Este não o será ainda. Mas é nosso! E há uma Águia que está derretida, esperando que o Leão venha a estar outro tanto com a Naide.

domingo, 26 de agosto de 2007

A Mulher dos Sete Ofícios

Dentro do critério que noutro blogue e campeonato me propus, o de publicar fotos de atletas que venham a bater recordes do Mundo ou da Europa nos Mundiais de Osaka, eis Carolina Kluft, nova detentora da melhor marca do Velho Continente no Heptatlo. Esta Menina de 24 anos corre 100m barreiras, 200m, 800m, salta em altura e comprimento, lança peso e dardo, melhor do que nenhuma outra das provas múltiplas, na babada Europa a que pertence a sua Suécia-mãe, tudo em dois dias, E se o poder do seu corpo pode fazer alguma impressão, não se passa, apesar dos pesares, o que traumatizava, por exemplo, na antiga corredora de 400 e 800m Kratochvilova, semblante fechado e linhas absolutamente rectas no tronco. De tal forma que até posou para fotografias artísticas... De longe, a Atleta-Modelo!

Imagens da Leitura 8

O Livro de Poemas de Russell Flint

Não é da tentativa de poetar que falarei, pois já Chesterton dizia que ela era universal no Homem, desde o mais empedernido erudito ao mais espontâneo e iletrado pastor. Refiro-me, sim, à voga que teve a publicação de poemas entre tanto amador, nos múltiplos sentidos do termo, quantas vezes em "Edição de Autor". A razão tem uma origem interna e outra funcional. A primeira estava em a nossa cultura da segunda metade de Oitocentos e primeira do Século XX ter infundido a crença de que toda a alma tinha o direito a expressar artisticamente o Único presente no que sentisse; e que a poesia, por não enfronhar em noites de vigília e métodos outros que os dos manuais de versificação seria o expediente idóneo para o concretizar. A segunda motivação era a de ser tido como o meio por excelência para chegar ao coração da Mulher. Poucas seriam as que teriam paciência para estimar a dedicatória de um romance, ou de um tratado, em que muitas personagens ou ramificações temáticas lhes disputariam o papel de Centro das atenções. Enquanto que meia dúzia de estrofes eram fácilmente postas a falar apenas da Amada. E, com arte muito variável, grassaram os exemplos dessa preocupação.
Acresce que a ficção era tida, tanto em manifestações dos direitos do coração no Romantismo, como na relativa abjecção ditada pelo cansaço, do Realismo, como eventual força desagregadora do Matrimónio, enquanto que os versos apareciam como a natural declaração que poderia a ele conduzir, ou legitimar "com algum contributo estético" outro tipo de relação, em caso de impedimento proibitivo.
Deste império do sentir brotou a necessidade da resposta feminina. À conquista no sentido de acção sucedeu a necessidade de dar voz à Conquista, no sentido do Bem Requisitado. Daí que as Mulheres tenham começado, igualmente, a editar o que na alma lhes ia. Garantiu-se assim o efeito poético multiplicador, pois na boa sociedade não tardou a considerar-se a habilidade de versejar como um predicado mais, talqualmente saber tocar ou pintar. Realizando do melhor que conservamos, como muito lixo, porque, evidentemente, em Arte é a Forma o critério de qualidade, enquanto que a Sinceridade apenas o será na esfera do afecto.

Singularidade Em Cerimonial

A Taça de Saké de Matina Theodosiu
Os vasos para saké que tenho e de que falei são mais deste tipo aqui ao lado, Querida T, apesar de lhes crer as cores preveríveis, embora um pouco sombrias.
E porque notei grande exigência protocolar no consumo da célebre aguardente de arroz japonesa, pareceu-me adequada esta imagem de dádiva sacral: Um Sacerdote Xintoísta Oferecendo Saké aos Espíritos, estampa do Barão Von Raimund Stillfried. Como sou mais ambicioso, ofereço antes ao Espírito, quer dizer à T e à JúliaML.

sábado, 25 de agosto de 2007

Imagens da Leitura 7

Jorge Luís Borges escreveu certa vez que concebia o Paraíso como uma espécie de biblioteca. Endosso sem reservas o entendimento e contribuo com duas achas para a fogueira: logo à chegada às Portas Celestiais deparam-se os suplicantes da admissão com uma prometedora cena em páginas alicerçada - o Arcanjo Metatron devorando no Livro da Vida os pormenores do nosso Deve e do nosso Haver. E com a Autoridade que assiste a um réprobo em matéria de Infernos, dificilmente posso, por outro lado, imaginar danação maior que o encerramento em profundezas de que os códices estejam excluídos.
Até porque o Demo não pode ser grande leitor. Quando perde o seu tempo sorvendo um calhamaço, produto do espírito do Homem, em vez de tentar que os humanos assinem os pactos pelos quais vendam as almas, revela-se um mau profissional: mesmo tratando-se de utilitários manuais, como este diabrete de vocação enganada, lendo o que o ajude a assustar em vez daquele que o ensinasse a cativar.
Mas deixo à consideração de Quem por aqui passe uma proposta escatológica que não prescinda do critério discriminador, como em tudo defendo para a Vida: Céu e seu Reverso como depósitos de alfarrábios - o primeiro de todos os exemplares de escrita estimável, o segundo das traidoras desgraças que, por inépcia autoral, tornem penosa a descodificação...

Quem Parte e Reparte...

T na Máquina do Tempo: Dama Vertendo Chocolate (La Chocolatière) de Jean-Etienne Liotard

sexta-feira, 24 de agosto de 2007

E Se Fossem Estes Bombeiros, Marta?

Imagens da Leitura 6

A Leitura de Bruneau Carcel

O alto conceito em que se tem aquilo que é publicado em livro pode bem levar a um apequenamento de si pelo Leitor, ciente de que a procura da plena absorção do espírito que gerou a obra estará acima das suas faculdades. É muitas vezes uma ilusão, mas, por ser encomiástica de outrem e expressar modéstia, não de condenar. O escritor enfrentra muitos perigos, tal a coagulação pela pompa da estatuária ou das instituições, tão perigosa para o intercâmbio entre quem escreve e lê. Por possuir maior difusão reveste-se, inclusivé, de risco maior do que as infecções de que o público é portador, o sentimentalismo popularucho, as marcas deformadoras das interpretações deficientes e a miopia psíquica que não deixa abarcar o conjunto.
Ler é como conversar, dançar com um par, ou amar: o segredo está no encaixe das concepções e do ritmo que conduz à harmonização, não tolerando o solipsismo e as paragens que procuram ampliar os detalhes, a ponto de os isolar.

A Doce Mendicidade


Claro que os chocolates, em tablette ou bombons são um luxo de certos Dias. Vejam só o aparato de uma degustação dele de que a T e as Amigas se rodearam para levar a cabo a prova. Só que surgiu lá um réprobo terrorista, suicida como se demonstra pela confecção do presente postal, a exibir o seu cinto de explosivos, que ameaçava fazer rebentar se lhe não dessem um docinho...

quinta-feira, 23 de agosto de 2007

A Vida ou o Luxo


Não, Querida T. Não posso aceitar um sabonete, fico apenas com o brinde. É que cá por casa, desde tempos ante-diluvianos, havia estrito apartheid entre os sabonetes usados pelos dois Géneros. Apesar de a bateria de cosméticos materna encerrar coisas melhores e mais variadas, para as higienes que davam solidez às toilettes, no dia a dia íntimo os homens usavam Lifebuoy, como o José Águas; e a Senhora Lux, como a Amália e a Jane Russell. Já não me lembra estas anunciadeiras, embora ainda recorde mais do que bem a Natalie Wood, a Pfeifer - que ainda não era o que se tornou - e a Victoria Principal, a espumarem com ele. Mas isso foi em dias que voaram há menos tempo. Ia a dizer que era o comportamento familiar antes da cedência à mariquice do gel, a cuja tirania, porém, também sucumbi. Mas lembrei-me das origens do sabão, conhecido na Babilónia e na Judeia remotas, embora, até ao nosso Séc. XIV, com outros fins - empastar o cabelo à laia de brilhantina, ou tingi-lo de... ruivo, como faziam Gauleses e Germanos. Diria a Bomba Inteligente: "uaaaaac!"
E depois, o sabão, mesmo na suave vertente cosmética, é artigo perigoso. Duas escolas lhe disputam a origem do nome nas línguas latinas: a que a faz derivar da famosa fábrica de Savona e a que lhe quer encontrar raiz comum a outros idiomas no facto de terem sido encontrados restos suspeitos de haverem dado corpo a esta substância junto do Monte Sapo, onde, na Roma Antiga, eram sacrificados animais, vindo, segundo a tese, as suas gorduras, misturadas com cinzas, a gerar o produto de aaaargh beleza. Duplo "uaaaaac!".
A insensatez dos sábios chegou a um desafio para duelo entre os linguístas adeptos de uma e outra opções. Felizmente não se chegou a efectivar.
Enfim, uma espuma, dos Dias! Viva o Luxo e o Seu Repuxo.

Imagens da Leitura 5

O Filósofo (O Leitor no Parque) de Carl Spitzweg
Habituados estamos a ver pelos jardins públicos que teimam em contrariar o cogumélico betão pessoas imersas nos seus livros. Fazem-no na mira de se impregnarem da calma e beleza dessa natureza podada e circunscrita, para melhor aproveitarem o que vão lendo. Poder-se-ia porém esperar de um filósofo atitude diferente, com idênticos elementos. A saber, a utilização dos escritos problematizantes como doping, na actividade de interrogar e explicar a Natureza. Por isso mesmo uma representação de um desses porteiros do intelecto talvez ganhasse em pintá-lo com um livro entreaberto e olhos fixos na vegetação circundante, não de costas voltadas para um busto feminino incerto, ao qual podemos atribuir a carga simbólica da Sabedoria.
Contudo, tendo em conta a proximidade das posições, variando apenas o momento eleito para a captação, podemos repousar sobre a conclusão de que os portadores de textos editados, quando em encontros imediatos com o mundo vegetal, tanto podem ser homens procurando ser sábios, como sábios empenhados em não fazer esquecer a sua condição de homens. E quem sabe se uns e outros não se encontrariam no escapismo, caso as leituras empreendidas pelos representantes de ambas as categorias, no caso, fossem, por exemplo, romances policiais?
A Leitura tem como principal propriedade garantir a suportabilidade da Vida. Cowley disse:
Deixem a Natureza e a Arte fazer o que lhes agrade,
Depois de tudo feito, a vida é doença incurável.
O que nos leva à certeza de que a escrita não é mera prescrição contra as dores, mas verdadeira condição da sanidade. E que a desistência de a redigir ou consumir será o começo do arrastamento para o fim certo.

quarta-feira, 22 de agosto de 2007

Mais Vale Prevenir

À T, porque com nervos d´aço nem as picadas causam males maiores...
Não evita é ferroada deste insecto que vai postando: "em vez do café", ehehehehehehe!

Sobrou-lhe um "I"zinho Assim...

Na véspera do jogo contra a Arménia a argúcia de Scolari fez com que alertasse o público português contra os perigos que à representação do País o Estádio Republicano, bem visto como "tapete remendado", acarreta. Tivesse o Seleccionador suprimido o "i" da primeira palavra da perigosa entidade e, como ensina a outra do anúncio, sobre isso nada haveria a dizer.

Imagens da Leitura 4

Depois de ter postado, em três dias, exemplos de Grande Arte, não resisto a dar esta imagem, por polémica que possa ser. Não me motiva o fito de abastecer libido padrão do Tempo. O que me move é tirar da postura em análise uma dupla dimensão para os coleccionadores destas impressões estivais. Está longe de ser a Bibliotecária que se vê a ideal para o ofício. Essa tenho-A como uma Querida Amiga que se não deixa fotografar em tais preparos, preparados, ou... preparativos. Mas penso que podemos retirar do "boneco" dois dos mais insistentes dons da Leitura: a devoção que gera solidariedades entre os consumidores livrescos cujo entusiasmo atinja o culto; e o Eros, no sentido de fecundidade consequente, que se desprende de qualquer absorção de texto, quer dizer, da acção sobre o sujeito, de trechos que, ao contrário de tantos outros, não resvalam pela rampa fria do adormecimento espiritual intocado, logo, do que inactivo permanece. É uma condição necessária à actividade mental a que algo escrito subjaz.
Entretanto, considerando o dado histórico de os hábitos monacais femininos serem decalcados dos trajos das Viúvas de outrora, uma terceira linha de raciocínio se faz valer: a de ser o livro o substituto ideal do ente vivo que infirma a Solidão. Razões mais que bastantes para lhe agradecer.

terça-feira, 21 de agosto de 2007

Há Que Tê-los?

A Violação de Picasso

Pegando no que o Çamorano diz de Camacho, "no seu sítio e bem grandes", essa crua metáfora da coragem? Sim e não, como um só facto comprova. A afirmativa vale para o Presidente Sarkozy, que exibiu o arrojo de se pronunciar pela castração química (consentida) dos delinquentes sexuais perigosos que queiram ser devolvidos à liberdade: não apenas demonstrou fibra para introduzir a inovação num país latino, o que era dado como impossível, culturalmente, como desafiou, proclamando "não ter medo das palavras".
No respeitante à negação... vai inteirinha para o tipo de prevaricadores visados. Com esta reactividade, as violações já evidenciaram muito melhores cores, o que picasseanamente vemos profetizado.
Será que o Chefe de Estado Francês apostou em fazer-me dizer demasiado bem de um político democrata? Irra, já nem me reconheço!

Imagens da Leitura 3

A razão profunda de as Mulheres prezarem tanto as crianças não residirá só no enlevo perante uma inocência idealizada a partir da relativa fragilidade. Vive sobretudo do prolongamento de Si que nelas vêem, enquanto os carregamentos de experiência e noções não moldam uma pessoa diferente. Contrapartida da inquietude masculina perante esses seres meios loucos, sempre ensombrada pela incerteza do concreto em que se tornarão os seus herdeiros, donde a preocupação maior em fortalecê-los, para que uma continuidade honrosa seja garantida.
Está pois garantido o sucesso da representação desta imagem junto de ambos os géneros: a velocidade do aperfeiçoamento indiciada pela leitura precoce, por um lado, a impossibilidade de manter durante mais tempo a concentração, pelo outro. Ou uma substituição de outra metamorfose ambiental por outra - a narração do livro cedendo o lugar à potencialidade do sonho, correspondendo afinal à pessoalíssima volição que, intimamente, os adultos dirigem ao menino, o que nele encontram de próprio e o que para ele desejam.

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Surpresa Pelo Tarde

Surpresa na Tarde de Georg Fenkl

O Marido é o último a saber? Coisa do Passado, agora essa posição de lanterna vermelha cabe ao treinador do Benfica. Pelo menos se for o simpático e recto Engenheiro que ocupou esse lugar até hoje. Não se põe em dúvida a honestidade do Homem. Mas o meu Jardineiro também é honestíssimo e não lhe vou dizer para treinar o Clube. Longe de mim duvidar do saber futebolístico, dentro dos limites técnicos, de Fernando Santos. No que parece totalmente incapaz é de correr riscos no lançamento de jogadores e no entendimento do que se esperava do trabalho dele. No ano transacto, só com muita lesão e depois de ter desviado Katsouranis, se dispôs a lançar David Luiz, o melhor defesa central da equipa desde Mozer e Ricardo Gomes. Tem uma obsessão por um plantel pequeno, o que estará bem para o Estrela da Amadora, mas é incomportável com a carga de jogos dum Benfica. Acaba, por conseguinte, a dispensar jogadores, sem verdadeiramente os testar, como Stretenovic, ou o Diego que brilha no Brasil; e como quase ia acontecendo a Dabao. Tem uma fixação em Nuno Gomes, quer dizer, em entrar em campo com dez. Quando decide mudar a posição natural de um jogador faz disparates inacreditáveis, como o de forçar o pobre João Coimbra a ala esquerdo! Mas, acima de tudo, quando começa com os esgares de angústia e a embirrar diante do aperto do colarinho dá aos jogadores uma mensagem que é o contrário da confiança.
O facto de ter declarado que é surpreendente o despedimento de quem não perde há 22 jogos na Liga demonstra bem que não entende o que se espera do orientador do Glorioso. Que não viva de empatar, mas da empatia que gere.

Eu gosto de Camacho e não só na vertente humana, como no caso do despedido.

Imagens da Leitura 2

A Lição de Leitura por Delacroix, de A Educação da Virgem

Meditação sobre o Transcendente do lido.
Sendo - como somos - um dos ramos das Religiões do Livro e, considerados os três grandes monoteísmos, o que mais cumpre a virtualidade Dele, universalmente aberto a quem o queira ler e ao complemento por outros - a escrever e folhear -, importa determo-nos na função de "Espelho da Mediação" entre o Incorpóreo Divino e a Humanidade Que Dele carece: os Instrumentos da Salvação face às Páginas da Revelação, ou seja, a Mensagem de Deus na dupla inteligibilidade, o Transmitido, pelo Verbo Transcrito; e a Extensão Carnal que O mira: Santa Ana ensinando as primeiras letras a Maria e a Passagem do Testemunho Dela ao Fruto Que Redime, atestado pela aprendizagem na condição humana a que descera para abrir o Caminho pelo Exemplo.
Na estrita óptica do Ledor comum, tendo presente o Demónio dos Tipógrafos, referido por Anatole France como o que os assalta adulterando o intuito do imprimido, cumpre invocar a Intercessão de Nossa Senhora, talvez nas Vestes do Socorro, contra o que poderemos chamar o Demónio dos Leitores, o que desvirtua o sentido das páginas que em cada caso tentamos assimilar.
Quem nunca se viu apoquentado por este Tentador que atire a primeira pedra.

A Madona do Livro de Filipepi (Botticelli)

domingo, 19 de agosto de 2007

Prenda de Anos

O Meu Amigo Pedro Guedes, no seu resistentíssimo «Último Reduto» celebra hoje um aniversário mais. Noutros anos já disse o quanto Lhe devia. Como no meu anterior poiso teve a bondade de confessar como detestava cobras, a propósito de uma foto de Nastassja Kinski enrolada numa, tenho o grato prazer de ofertar uma filmagem do triste fim de um exemplar dessa espécie. Sublinhe-se a frase final: "the eagle wins". Contra todos os venenos, Pedro, como o Teu Blogue.

Imagens da Leitura 1

94 Graus à Sombra
Ora então que proponho, para manter a ligação nestes dias de repouso? Em cada dia uma imagem de Leitura que me haja seduzido, retomando com Setembro o padrão habitual.
Assim, começo por pensar na debandada para o campo, com a consequente alteração da própria pele, depressa coberta por aquele pó que inexiste na cidade, maneira extrema de nos sentirmos outros e de escaparmos às rotinas que oprimem, como, em certa medida, ao horror da ausência delas, expresso na condenação a permanecer numa metrópole abandonada por aqueles com que habitualmente convivemos e a tornam passável.
Como a imersão num livro, fuga às caras anónimas que somos forçados a contemplar em cada dia útil, essa condição incompatível com o Belo. E, adicionado a ele, o Bucolismo acentuado pela Literatura, transportando duplamente a nossa personalidade a metamorfoses e ambientes extraordinários, os quais, como o sonho, contribuem para o equilíbrio mental - que não prescinde de se visitar numa forma de si diversíssima da que, nos outros meses do ano, nos cansa.
Por isso gosto tanto deste quadro de Alma-Tadema: a sombra não se aplica apenas à do Astro-Rei; é também a da Amizade a que acabo de me acolher, como dela se poderia dizer ao calor, de resto.

sábado, 18 de agosto de 2007

Estado Em Que Se Encontra Este Blogue

O Espírito da Contemplação de Albert Toft

Sempre soube que ler é melhor do que escrever. Mas alimentei a esperança de que um blogue fosse momento de diversão, mesmo tratando de coisas sérias, por vezes. Não quereria ser motivo de enfado, muito menos magoar alguém; e sinto que as presentes e prementes indisponibilidades não me permitem prosseguir com êxito a via de, modestamente, trazer momentos bons Aos que deram a honra de ler-me. Vamos então parar até 2 de Setembro.Depois decidirei entre a retoma e a retirada. Até lá, boas férias de mim.

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Da Barbárie à Barbaridade

O Repasto dos Filósofos de Huber

Não cesso de me abismar com a estranheza que certos comportamentos provocam nas Pessoas, como se fossem grandes inovações, quando a História está pejada deles. Ecoa a net uma ensurdecedora algazarra sobre a alteração dos verbetes da Wikipedia por entidades tão conspícuas como CIA, FBI, Vaticano e o Partido Democrático Norte-Americano. Deixemos de parte a alteração preconizada a partir da Santa Sé, uma limpeza do curriculum de Gerry Adams, última recorrência da urbanidade estabelecida para com tanto terrorista que chegou ao Governo, de todos os quadrantes ideológicos e coordenadas geográficas. Os outros casos apresentam-se como suavização de acções próprias pouco dignas e de insultos aos adversários. Em nada espanta, pois, que o gabinete do Sócrates que nos rege tenha seguido esta linha de comportamento - fez as alterações que lhe convieram na triste história das vaidades académicas, consubstanciando, em simultâneo, com a eliminação da engenharia, uma dura qualificação daquele que se revelou o maior inimigo do actual PM: ele próprio.
Entretanto, o uso e abuso de "repositórios de saber" pretensamente neutro para veicular ideias ou noções que conquistem para a parte dos autores é coisa velha de séculos. Já Diderot, D´Alembert e seus cúmplices, aqui retratados por Huber, o fizeram, através da célebre Enciclopédia, preparatória da Revolução. Que as ideias, artes e ciências tenham dado lugar a apagamentos de prisões, documentos falsos ou a classificações fáceis traduz apenas a degradação que as compilações de saber pronto a usar sofreram. Que espanta? Se as televisões e as universidades, proliferando, deram no que deram, por que raio a abertura da redacção enciclopédica a qualquer bicho careta poderia suscitar outras expectativas? Um banquete parece então muito apropriado para ilustrar as constantes de um comportamento que espera que papemos os mais subversivos cozinhados. Vandalismo informático? Talvez, mas, acima de tudo a consagração das subjectividades mais interessada e interesseiramente deformadoras.

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

Condolências a Satan?

Um Anjo Caído de Jack Paul Sanders

Pouco importa que as sapiências especializadas nos esclareçam de que o Satan adorado pelos Yazidis, alvos dos últimos atentados mortíferos mo Iraque, seja diverso do que conhecemos e corresponda, sim, a um anjo caído, mas que invertera a marcha por um diluviano arrependimento. Ao excluírem a capacidade interventiva de Deus neste Mundo e atribuírem o supremo governo dele a uma entidade que proclamam ter conhecido o Pecado, não há como escapar ao reconhecimento de adoração do Mal, seja por Muçulmanos, seja por Cristãos. E ao, comunitariamente, participarem em práticas ainda recentemente reiteradas, de apedrejamento até à morte de raparigas que queiram casar noutra religião, essa seita mergulhada no secretismo deveria suscitar a repugnância, a condenação e a intervenção de todos os Ocidentais, religiosos ou não.
Significa isto simpatia para com as explosões da Al-Qaeda? Nem por sombras, pois a fecundidade criadora e fantasista do radicalismo islâmico que a informa facilita a identificação de cultos diabólicos noutras paragens, começando pelo nosso património espiritual, para além de assassinatos em massa poderem sempre atingir elementos isolados não-comprometidos nos crimes das suas colectividades.
Mas é significativo que a União Europeia tenha condenado com tanta veemência o castigo dos adoradores do Diabo. Se acreditasse nele, provavelmente, até lhe enviaria um cartão expressando os seus sentimentos. Simpatia que, do ponto de vista muçulmano maioritário, será um indício mais para determinar a natureza maléfica dos poderes que nos regem. Da qual, aliás, não tenho dúvida, mas que deve ser atribuída aos tentados em vez de se procurar para ela a (in)dignidade terrífica do Tentador.
Um caso de venda da alma, então? Talvez não, mais de aluguer do corpo. É que a política escancarada de imigração sem discriminações de segurança permitiu uma comunidade considerável de membros Yazidi na Alemanha. Com a liberdade de circulação, quer dizer à nossa porta.