domingo, 12 de agosto de 2007

A Outra

Perfil de Cleópatra em moeda DO TEMPO, para tentar responder à questão pertinentemente levantada pelo Carlos Portugal (acrescentado às 22.49H).

Imagem do Século XV, representando os suicídios de António e Cleópatra

Se a cobra que tentou Eva é a estrela maior de tais répteis, a que terá morto Cleópatra faz uma sombra condigna. Ambas serviram para matar e, curiosamente, prometendo a imortalidade, pois a áspide que terá servido para a rainha ptolomaica abreviar a existência era tida não só por insígnia da realeza, como a sua mordedura por garante da vida para além desta. O acontecimento é situado a 12 de Agosto e a romantização do réptil apertado contra o seio não mais do que uma projecção de desejos humanos no animal. Não só os entendidos dizem que a eficácia do veneno introduzido na face interna do braço seria maior, como os primeiros relatos afirmam expressamente que aí foram encontradas as marcas. Resta o problema da beleza, tão iludido pela frase de Pascal Se o nariz de C fosse mais curto a sorte do mundo teria sido diferente; ao contrário da leitura que hoje predomina, não é uma apreciação da atracção dos traços, mas um parecer técnico de Fisiognomonia, que sustentava poder a inexistência das dimensões e forma aquilina do apêndice, tal como nos é dado pelas moedas do tempo, traduzir-se numa obliteração do carácter forte e determinado de que seriam signos, mudando assim a História.
Resta o problema da beleza dela, desmentida desde logo por Plutarco. Considerando o que se diz dos homens de hoje, poder-se-ia afinal reiterar que o Poder é auxiliar de monta na busca e êxito das habilidades de leito. E que funciona para os dois géneros...
O que nos traz de novo à ilustração - na sua ingenuidade representativa, abstraindo de não terem sido simultâneos os suicídios da Egípcia e do Romano -, a duplicação do animal encarna a duplicidade presente na notícia dada antes do facto, na mira de ainda se reconverter em tentadora de Octávio, bem como o símbolo erótico que também é.
Na simplicidade se patenteia, às vezes a intuição mais sucedida.


4 comentários:

Anónimo disse...

Bem, Caríssimo Amigo, creio que Pascal sabia bem pouco de etnologia... Ao que parece, o apêndice nasal da rainha ptolomaica possuía, não uma dimensão desusada, mas a rectilinidade, sem depressão ao nível dos olhos, que fazia a característica predominante das etnias helénicas. Isso deveria espantar tanto romanos como egípcios, como ainda hoje causa estranheza a quem depare com uma mulher (ou homem) com essas características.

Nos meus tempos de faculdade, havia na embaixada da Grécia, ali ao Restelo, uma funcionária com um apêndice semelhante que se cruzava comigo no autocarro. Não se poderia dizer que fosse feia, até pelo contrário, mas o nariz helénico causava estranheza a muita gente.

Contudo, no caso de Cleópatra, há rumores de que ela se dedicaria a «malas-artes», e que com ela terá «enfeitiçado» Gaios Júlio César e Marco António. Coisa que muitas outras mulheres têm a mania de usar, como substituto do Amor. E assim atrairem a tragédia.

Um grande abraço.

O Réprobo disse...

Meu Caro Carlos Portugal,
julgo que Pascal teria em mente esta imagem, uma excepção à rectilínia configuração predominante na nasotipologia helénica, é facto.
Abraço

Anónimo disse...

Caríssimo Amigo:

Se a moeda é fiel ao perfil da personagem, trata-se realmente de uma excepção ao perfil helénico. Contudo, há quem afirme que a figura da dita moeda terá sido esculpida por quem detestava Cleópatra, baseando-se na estranheza que o apêndice nasal helénico causava no comum dos mortais para dar aso à fantasia. Com efeito, o nariz (narigueta, neste caso) da figura da moeda mais se assemelha ao nariz de certos senadores de Roma - ou mesmo de certas matronas - do que a um nariz grego ou macedónio.

Repare que o escultor até lhe colocou uma maçã-de-Adão, para além de um queixo totalmente masculino. Parece a colagem do perfil de um cônsul ou qualquer outro patrício, à cabeleira e ao colar de uma mulher... Há pelo menos outra moeda, da qual esta parece ser a cópia caricatural, que, apesar de desgastada, não atribui a Cleopatra
Thea Filopater um tal apêndice ou o pomo-de-Adão.

Vou ver se arranjo uma imagem para Lhe enviar.

Um abraço.

O Réprobo disse...

Obrigadíssimo, Caro Carlos Portugal. Não esqueçamos o testemunho de Plutarco que de várias fontes disse ter colhido notícia da mais que discutível beleza da rainha, quando, pelo contrário, o perfil helénico a consubstanciaria. Em todo o caso, Pascal parece que se reportava a este informe.
Abraço.