domingo, 13 de julho de 2008

Orelhas Poucas

Desta foi McCain, a propósito de Obama, mas muitos outros candidatos a qualquer coisa tentam desqualificar os adversários por ocos palavrosos, reservando-se para si o monopólio dos actos. Tenham ou não razão, em sistemas de campanhas eleitorais conseguirão sempre algum eco, não por serem este ou aquele, deste ou daquele, mas porque a essência da oratória num político é a do vendedor que, em vez do cheque limitado recebe o voto pagador em infinda quantia.
A Palavra é neutro conceito. No caso do Pregador, sentimo-lo como um intermediário, cuja compensação não é redutível a uma quitação em seu nome, antes aponta para a concórdia dirigida Ao Que transcende.

Por isso o Padre António Vieira pôde justificar a parenética, reabilitando o discurso proferido:
Bem é que bradem alguma vez os pregadores, bem é que gritem.
Por isso Isaías chamou aos pregadores nuvens: Qui sunt isti, qui ut nubes volant? A nuvem tem relampago, tem trovão e tem raio: relampago para os olhos, trovão para os ouvidos e raio para o coração; com o relampago alumia, com o trovão assombra, com o raio mata. Mas o raio fere a um, o relampago a muitos, o trovão a todos.
Assim ha de ser a voz do pregador, um trovão do céo, que assombre e faça tremer o mundo.
De acordo, mas porque capaz de conduzir os expostos a um abrigo definitivo. Já as galimatias dos que disputam um mandato são a tempestade permanente e viciosa - não se diz que a batalha da reeleição começa no dia seguinte ao da eleição?

6 comentários:

Cristina Ribeiro disse...

Mas, pelo que das palavras escritas resulta, até que acho o "spot" bem engendrado, desde que não se fique por aquilo que ele pode indiciar: mera publicidade enganosa; se o, aqui também pregador, à palavra juntar o acto...
Beijo

O Réprobo disse...

Penso, Cristina, que a finalidade eleitoral diminui sempre. Os Eleitos, no sentido da Mesa do Senhor, não passaram por escolhas manhosas em cabinas fechadas.
Beijo

Anónimo disse...

"em sistemas de campanhas eleitorais conseguirão sempre algum eco"

Está aí um inextricável paradoxo: sabendo-se que o som não se propaga no vácuo, como pode haver eco nas cabeças dos eleitores?

O Réprobo disse...

Ora, Caro Anónimo, a mensagem não chega a penetrar lá, tão dura é a carapaça, já de si suficiente para devolver impensadamente o grito que lhe foi dirigido. Mas há mais, a população foi treinada para pavlovianamente, a cada discurso de promessas vãs, reagir com o depósito de um papelucho numa ranhura muito ranhosa.
Abraço

Anónimo disse...

Ora até que enfim que percebi a origem, ou pelo menos a cristalização do estilo trovejante e fulminador que na minha infância ouvi a tantos sacerdotes menos dotados para a arquitectura do relâmpago do que o sempre excelente Vieira.

Cumps,
P.SG

O Réprobo disse...

Meu Caro Pedro Souto Guedes,
Já se sabe, há muitos que conseguem emitir sons, mas ultrapassar a barreira do som está reservada aos happy few...
Abraço