quinta-feira, 19 de junho de 2008

Subtilizações

A 19 de Junho de 1867 Maximiliano da Áustria, que se acreditou Imperador do México, foi fuzilado em Quéretaro. Não importa aqui considerar a figura, uma mente perturbada pelo Liberalismo e por estar eternamente na sombra do Irmão, o Habsbutgo Soberano, como não interessará fazer agora uma diatribe contra o aventureirismo ditado por um Bonaparte com inveja do tio. Quero tão-só falar em uma das Fotografias do Século, a da camisa ensanguentada com as marcas das balas da execução. Por que terá esta tido muito mais êxito junto do público culto do que outras que o Autor, François Aubert, na altura, tirou, como a do corpo embalsamado ou a do local de execução em que se haviam erguido cruzes, à maneira de novo Golgota?
Será elipse ou mecanismo paralelo ao da pornografia? A primeira interpretação pode estribar-se na sonegação do corpo, apenas indirectamente referido pela peça de vestuário. O segundo ponto de vista teria por ele a proximidade da focagem, com o pormenor hard aqui encarnado no sangue, sem distracções de expressão ou atmosfera. Em rigor, o génio parece-me residir na conjunção dos dois: mais do que uns restos ensanguentados a que, desgraçadamente, as notícias nos habituam, o sangue separado do remanescente da extensão humana está muito mais apto a gravar-se impressionística e impressionantemente no nosso espírito. Até porque a remissão para os arquétipos faz-nos aproximar o branco da blusa ao do lençol de qualquer fantasma que se preze.

2 comentários:

ana v. disse...

Belíssima reflexão, Paulo.
Beijo

O Réprobo disse...

Obrigado, Querida Ana, penso que as grandes fotografias que deram brado na História da Arte merecem ser repensadas, para não caírem no esquecimento nem nos deixarem frios à sua influência.
Beijinho