sexta-feira, 30 de maio de 2008

Janelas Abertas

Passando a apresentar outra das aquisições recentes, tenho como grato poder ver um autor de outra nacionalidade encontrar nos Minhotos, que constituem um Nicho importante dos Meus Leitores e Amigos, aquele misto de actividade e sonho que julgo ter sido o que levou a Cristina Ribeiro a considerar-Se "um bocadinho nefelibata, mas só às vezes".
Da Província do Minho - mais exactamente nomeada Entre-Minho-e-Douro - os portugueses dizem de bom grado que é o paraíso lusitano.
(...)
Os Minhotos têm rostos claros, leais e limpos.
(...)
O calor do clima, a atmosfera húmida, uma sombra velando frequentemente o brilho vermelho do sol, o tom mais surdo mas ainda verdejante da região, fazem-na uma espécie de Bretanha meridional de que a melancolia não está, no entanto, excluída. O Minhoto é um sonhador mais metódico, mas também mais feliz do que o Transmontano, ou o habitante das Beiras.
Uma canção extravagante e algumas palavras feitas para a rima quiseram que os portugueses sejam alegres. Uma tradição bem estabelecida afirma que eles são tristes.
(...)
Nas classes mais educadas, onde o amor do país, o orgulho nacional são tão profundamente ancorados, a recordação das glórias do passado acrescenta à sua amargura. Este país, como varanda da Europa, desempenhou um papel tão fulgurante que ainda está um tanto deslumbrado dele. E por um singular ricochete, quanto mais um português é orgulhoso do seu passado, quanto mais ele mede com um tanto de amargura a diferença entre outrora e hoje, mais tende a tornar-se injusto para com a sua pátria, quer denunciando-lhe cruelmente os enfraquecimentos, quer não suportando que um estrangeiro o faça. Renascendo, segundo o esforço que empreende desde 1926, o país não dará mais azo a essas amargas críticas voltando a dar aos Portugueses mais confiança no seu destino.
Devo contestar num ponto essencial. Não creio, embora as peripécias históricas possam desculpar o diagnóstico, que o fulcro do tormento da reflexão que sobre nós fazemos tenha por base o tempo e a comparativa perda de importância. Essa é a ligação de estranhos cultos a isso predispostos, como a dos melhores espíritos patrícios, desejosos de afastar de si o mobil da Inveja. Não, não é sobre o Tempo, é sobre o Espaço o olhar que nos fere: verificarmos nos outros nossos contemporâneos a pujança e as realizações que nos desejaríamos, com o inerente esmorecimento fatalista que nos dá como delas incapazes. Por isso mesmo, ficamos igualmente tão escancarados à cópia do que se faz lá fora, o que doutro modo se não compreenderia.
O que não impede que este analista da nossa psique tenha acertado ao vislumbrar a última tentativa segura de construção genuína e isenta dessas duas pechas.

12 comentários:

CPrice disse...

como dizia alguém "Portugal é um país médio com a mania que é pequeno" .. vá lá que o Autor ainda nos coloca na "Europa Viva" ;)
.. brilhante a sua reflexão Caro Paulo.
Gostei muito.

Anónimo disse...

"Não, não é sobre o Tempo, é sobre o Espaço o olhar que nos fere: verificarmos nos outros nossos contemporâneos a pujança e as realizações que nos desejaríamos, com o inerente esmorecimento fatalista que nos dá como delas incapazes."

Bem visto. Mas será que reflectimos o suficiente sobre as RAZÔES profundas porque não o conseguimos fazer? Parece-me que não...

O Réprobo disse...

Obrigado, Querida Once. Há muito que venho matutando sobre a possibilidade de nos re-pensarmos sempre em função do Tempo não é um wishful thinking pelo qual nos abstraímos da infelicidade de comparações com os vizinhos.

Quanto ao título da colecção, as boas notícias são as que enuncia no Seu comentário. As más estão em o livro datar de 1940...
Beijinho

O Réprobo disse...

Pois está claro, Meu Caro TSantos, ou, fazendo-o, não damos aplicação prática às conclusões. De que outra forma se explicariam os últimos quarenta anos?
Abraço

Cristina Ribeiro disse...

O que gostei que tivesse partilhado connosco mais esta bela aquisição, Paulo!
Na primeira parte reconheci a minha Mariana :)

Mas essa amargura existe, ao vermos a inércia e decadência galopante em que caímos.
Beijo

Luísa A. disse...

Muito interessante, caro Réprobo. Será que a Cristina e os seus demais leitores minhotos se identificam com essa caracterização? A minha forte costela transmontana diz-me que a gente do interior é igualmente sonhadora, mas não é menos feliz. As partes restantes da minha «ossatura» identificam-se plenamente com o seu diagnóstico e com esse «esmorecimento fatalista» que nos faz incapazes. Embora me agrade acreditar nalgum efeito de «ressaca» histórica, porque a vida dos povos vai alternando os momentos de grandeza com os de pequenez. Agora estamos na cava da onda, mas (se sobrevivermos) talvez possamos regressar, dentro de outros quinhentos anos, à crista. :-)

Anónimo disse...

"...ou, fazendo-o, não damos aplicação prática às conclusões..."


Muito poucos o fazem, Caríssimo, e esses, se são ouvidos, não são escutados...

O Réprobo disse...

Querida Cristina,
também pensei no facies da Mariana ao postar o texto. Que, realmente, no antigo habitat dos Suevos abundam estas características parece seguro...

Compete-nos ir remando contra os contentinhos do Presente que tentam estiolar na origem qualquer germen de acção recuperadora.
Beijo

O Réprobo disse...

Querida Luísa,
na parte da identificação Minhota não meti prego ou estopa. Julgo que ainda é a influência da escola das etnografias e outras perspectivações, nomeadamente as estritamente musicais, que davam o Minho como centro das cantigas alegres, contrapondo-o às melodias dolentes do Sul. A. Pimentel resumiu a coisa.
Quanto à questão nacional, sem partições, eu estaria tentado a endossar o comentário que fez, com a solitária reserva de, para isso, ser necessário impermeabilizar-nos p quotidiano à escravização aos modelos para lá das fronteiras. Observar, aproveitando até, não é, tem de parar de ser, decalcar
Beijinho

O Réprobo disse...

Meu Caro TSantos,
tem de começar por aí a redescoberta da nossa dignidade, no caso coincidente com qualquer vestígio de eficácia.
Abraço

Luís Bonifácio disse...

Caro Reprobo

Vá até ao meu blogue. Tem uma pergunta minhota para responder.

O Réprobo disse...

Meu Caro Luís Bonifácio,
desde hoje de manhã que estou a tentar entrar nele, sem o conseguir.
Vou experimentar por outro lado.
Abraço