A Razão no Exílio
Vemos aqui no seu esplendor, em foto de Marc Lacroix, a alteração radical de uma tela holandesa "canónica" do Século XVII, segundo o arbítrio do Método Paranóico-Crítico, com a adição de narizes descomunais às figuras femininas, de uma muleta que virá a segurar o chapéu de uma delas e a conversão da doçaria certinha em géneros alimentícios inquietantes, com tortillas a invadirem as gavetas mnemónicas adulteradas.
Da racionalidade aplicada retirou também a conclusão a que a opacidade de outras visões. mesmo profissionalmente críticas, não havia conseguido chegar, descobrindo em Gérard Dou, um contemporâneo de Vermeer, a "pintura em três dimensões", introduzida pelas modificações de pormenores nos quadros de tema pintados em triplicado, traço até aí atribuído a uma anomalia psíquica do injustiçado pintor. Donde retiraria o processo similar da multiplicação de tratamentos temáticos com desconformidades dignas de um passatempo de descoberta das diferenças. Mas claro que também foi mais fácil atribuir este caminho à ainda por cima confessa avidez de dollars.
Numa entrevista que conseguiu alguma atenção, a Mervyn Levy, começa por resolver surrealisticamente a acusação dirigida a Pollock, de um chimpanzé ser capaz de expressar-se da mesma forma. Aceita, com a adverbial cautela, o juízo, mas faz disso um reconhecimento de promoção, em vez de uma tentativa de denegrir. Diz que a mão do colega é quase animal, enquanto a do macaco seria quase humana. E considera o primeiro um dos pintores mais importantes desse 1961 em que prestou o depoimento.
Mas não prescindirá de instrumentalizar teses científicas para servirem de meio de inspiração. Tal como a pintura de Fractal procurava correlacionar-se com Teoria do Caos, vai para o seu método pocurar em Planck a inspiração energética que evidenciará o pintor como o elo intermediamente criativo que devolve às formas figurativas a importância posta em cheque pela Abstracção. Mas indo buscar os fundamentos ao esguicho de uma por ele denominada Pistola Quântica, em paralelo com o que fizera Pietro de Cosimo ao traduzir as manchas dos escarros dirigidos a uma parede nos dragões fantásticos que povoam as suas obras. É confiar ao Acaso a sociedade na batuta, onde outros apenas a reservavam para a domesticação dele.
Um motivo-extra há para o trazer aqui: foi dele profético dom de retratar este pobre bloguista, segundo o critério que o olho certeiro da Cristina aqui pôs em destaque: Navio.
10 comentários:
En su post misantrópico se hacía referencia a cierta querencia por "o vil metal do Tio Sam" del gran pintor catalán........
Ab.
E aqui também, Amigo Filomeno. Não se quer é reduzir a esse mobil a Arte do Génio de Porto LLigat.
Abraço
Aí temos mais um fraquinho em comum, Paulo: eu também gosto imenso do louco Dali. Acho-o genial, e recuso-me a reduzi-lo à ganância pelo vil metal e à simpatia pelo regime no poder, porque acho que ele era muito mais do que isso!
O seu post está, como sempre, brilhante.
Um beijinho
Querido Réprobo,
mais louco do que o Dali só mesmo uma famelga de férias, de carro, pela Europa, regressar a Portugal e, depois de uma directa durante a noite pelas auto-estradas de França, parar depois da fronteira com Espanha, tomar o pequeno-almoço, e ir visitar o museu do dali, não acha?! :-|
Beijinho :-)
Faço minhas as palavras da Ana: "As always" !
Quanto ao artista, propriamente, reconhecendo a genialidade, há na sua obra momentos demasiado surrealistas para a minha camioneta...
Querida Ana,
claro está que a simpatia pelo regime no poder, em se tratando do Franquismo, era mais um ponto a favor. Mas nunca apreciarei um Artista ou um Escritor, ou um Actor pelas suas opiniões, embora o possa fazer com um filósofo, ou com um teorizador político.
Na pintura Do Grande Catalão, mais do que a impugnação da rigidez que nos ficou do Surrealismo em geral, penso ter permaqnecido a percepção das possibilidades multifacetadas das variações dos contornos como potenciação da quantidade de pistas para um sentido impreciso, consoante o ponto de vista do público. Assim - já que andamos em maré de referências à Física - como que uma transposição do Princípio da Incerteza de Heysenberg para a Pintura.
Beijinho
Querida Fugidia, realmente, aconteceu com Alguém que conheçamos? Ehehehehehe.
SD era bem capaz de retirar inspiração de tal sucesso, para uma tela.
Beijinho
Bondade da Cristina, a acrescentar à da Ana.
Mas o do quadro reproduzido não terá sido um deles, suponho?. Pelo menos encaixa na imagem que Lhe agradou, segundo disse.
Beijo
Claro que não Paulo.
o «Navio» corporiza bem a navegação do pensamento; e há muitas mais obras dele de que gosto...
Beijo
Bem me queria parecer!
Beijo, Querida Cristina
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