domingo, 16 de março de 2008

Potência E Impotência da Estética

D´Annunzio por Gaetano Martinez

Em 16 de Março de 1924 Mussolini ordenou a ocupação militar de Fiúme, no que fícou como vitória final da Política sobre a Estética. Até aí o jogo estava indeciso. É costume alguma vista curta crítica tentar fazer de Hitler & C.ª o predomínio do Estético sobre o Poder, coisa que veementemente contesto. Os dirigentes do Nacional-Socialismo não possuíam credenciais para encarnar essa aspiração e a própria concepção racial era uma abdicação de aferição do Belo, na medida em que passava um cheque em branco a todo o bicho careta e atitude que fosse "ariano", prescindindo da coincidência do Ideal no concreto, o que a Estética não consente. Tais dislates analíticos permanecem hipnotizados pelos desfiles neo-pagãos à luz dos archotes.
No caso do irredentismo italiano de Fiúme o caso era diverso: D´Annunzio tinha background estilístico e posições assumidas na (e com) Arte para poder sonhar a submissão, sempre perigosa, acrescento, de uma acção militar a um credo de esteta. Pegando num exército privado de seguidores foi o que fez e impôs um cânone, mais tarde, importado pelo Fascismo, que o idolatrou mas a que recusou sancionamento total. Foi uma ocupação e regência sem mais sofisticação institucional do que a vontade do Comandante, sujeita aos seus versos empolgantes da «Canzione del Carnaro», evocativa de um raid naval sabotador da Grande Guerra conduzido por Constanzio Ciano. Dessa experiência internacional de uma ocupação por uma guarda particular, ficaria o conflito com o próprio governo italiano que forçaria à rendição.
Do feito épico restariam o termo Duce, lá reinventado e os olalás dos versos desse informal mas omnipresente hino. O maior fracasso da vivência única nem foi a derrota das armas, que, por atraente no sacrifício, poderia enquadrar-se bem nos seus pressupostos motivadores. Foi-o, isso sim, a necessidade de recorrer à Nacionalidade como legitimação, conceito essencialmente político, em vez de se assumir como o que, de facto, tinha sido - a vontade de o indivíduo fazer triunfar o seu inconformismo perante a recusa do prémio devido ao sacrfício dos seus, no final desse conflito em que os vencedores tinham obsessivamente tratado a Itália como menoríssimo parceiro.
Quando os Fascistas emendaram a mão era já um mundo estranho que prevalecia, o das burocracias militares, partidárias e diplomáticas que o entusiasmo daquele punhado de revivalistas do Romantismo tinha alimentado a ilusão de vencer.

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