Mergulhos no Lodo
Visionamento, como passou a dizer-se, do DVD com um filme cuja existência me passara ao lado. «Eu, Peter Sellers», sofre de dois defeitos, como biografia: dos saltos cronológicos que escamoteiam partes da vida do actor e do enfeudamento a uma tese, a de ter sido moldado pela mãe, para não deixar que os laços com os que o amavam lhe empecilhassem a carreira, progredindo da ambição à insensibilidade e desta à crueldade. Como corroboração, o nexo simplista a uma deficiência de personalidade confessada e assumida na facilidade com que dava expressão a uma multiplicidade de caracteres, bem como a necessidade quase patológica de mudança de casa.
Um intérprete que se prestigiou por uma comicidade sem caretas vê desta forma desvirtuada a sua capacidade de representar, reenviada para insuficiências pessoais. No fim de contas, Sellers é mais o pretexto, o que acaba por ser pintada é toda a nossa época, com a obsessão da carreira a secundarizar todo o resto da vida, maxime a parte afectiva. Com a fatal insatisfação emergente, que, no caso do biografado, se plasma na aspiração a passar da Rádio para o Cinema e deste para um registo menos apalhaçado do que o da série da Pantera, de Blake Edwards. Como é tradução fiel, não só do homem, como do tempo, a permeabilidade às previsões de um parapsicólogo charlatão que lhe orienta as opções.
É o liliputiano mundo em que nos movemos - os grandes objectivos fixados, subsidiários do egoísmo, à mercê da exploração "sobrenaturalista" de quem saiba friccionar a vaidade. Vidinha sem coração, vidinha sem ver Deus.
Um intérprete que se prestigiou por uma comicidade sem caretas vê desta forma desvirtuada a sua capacidade de representar, reenviada para insuficiências pessoais. No fim de contas, Sellers é mais o pretexto, o que acaba por ser pintada é toda a nossa época, com a obsessão da carreira a secundarizar todo o resto da vida, maxime a parte afectiva. Com a fatal insatisfação emergente, que, no caso do biografado, se plasma na aspiração a passar da Rádio para o Cinema e deste para um registo menos apalhaçado do que o da série da Pantera, de Blake Edwards. Como é tradução fiel, não só do homem, como do tempo, a permeabilidade às previsões de um parapsicólogo charlatão que lhe orienta as opções.
É o liliputiano mundo em que nos movemos - os grandes objectivos fixados, subsidiários do egoísmo, à mercê da exploração "sobrenaturalista" de quem saiba friccionar a vaidade. Vidinha sem coração, vidinha sem ver Deus.
6 comentários:
S. Nunca gostei de Sellers porque o achava muito parecido com o intelectual que desviou a Lolita.
En el doblaje español le ponían hablar lento.......
Meu Caro Rudolfo Moreira,
aí está uma fira que nem aparece neste tentame biográfico. E nada menor...
Eu gosto de P.S., principalmente num filme que julgava o derradeiro, «Bem-vindo Mr. Chance» e é afinal indicado como penúltimo. Do Dr. Strangelve, claro. E de umas comédias inglesas em que a sua inserção na atribulada classe média não trai a persona apatetada de outros filmes.
Abraço
Meu Caro Filomeno,
na personagem de Chance Gardner isso parece-me mais do que adequado!
Ab.
Também não vi este filme, Paulo. Fico curiosa, depois desta sua bela análise.
Beijinho
Obrigado, Querida Ana. Faltou dizer que Rush funciona bem no papel de Sellers, sendo que o ponto forte continua a ser a discutibilidade ou não da tese e a inserção deste comportamento na normalidade coeva. E pronto, lá incorri em desgraça junto das paroles do Pedro Correia!
Bjinho
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