sábado, 22 de março de 2008

Desfastio Não É Resgate!

Todo o santo ano é o mesmo travo de repulsa pelo espectáculo das crucifixões voluntárias nas Filipinas. Sim, eu sei que, dentro do Catolicismo, desde que não desrespeite Dogma, menorize a Igreja, ou prejudique terceiros, deve ser dada uma razoável latitude a cada um na forma de se relacionar com o Sagrado. Mas partilho inteirinhas as reservas da Santa Sé quanto a estas inflicções de sofrimento pessoal e paradoxal, uma forma primitiva e rude de adoração, que não tem a homogeneidade dos votos ascéticos, nem participa da ânsia de fusão dos Místicos que recebem os Estigmas, com a agravante de corporizar um mimetismo alienante do Significado do Calvário, quando nada está em jogo, salvo o exibicionismo, ainda que bem intencionado.
Agora, quanto aos espectadores estrangeiros e abonados que se instalam nas esplanadas, de refresco e guarda-Sol em riste, para encontrarem naquele sabor local sofredor um ingrediente de distracção das suas vidas ocas, ao pensar-lhes as costas, não consigo impedir-me de reconhecê-las como território evidentemente usurpado pelos cremes bronzeadores àquele que de pleno direito pertencia ao chicote.

5 comentários:

cs disse...

vias ocas, como tão bem refere. Vidas ocas!!
Boa Páscoa

Anónimo disse...

para Sábado de Aleluia, não está mal..., para quem ontem falava do peso único da Sexta-Feira de Paixão... adequada fotografia...

O Réprobo disse...

Também para Si, Querida CS. É triste que haja vazios assim, pretensamente preenchíveis pela ociosa frivolidade que se compraz em espreitar o sofrimento!
Beijinho

ana v. disse...

É verdade, Querido Réprobo: Vias Ocas em vez de Vias Sacras. É o mesmo voyeurismo arrepiante e mórbido que faz com que se organizem excursões de turismo às favelas do Rio de Janeiro, como "curiosidade local".
E estamos tão próximos ainda, afinal(embora nos pareça que evoluímos muito), do espectáculo das execuções em praça pública ou dos tão apreciados massacres dos criatãos nas arenas de Roma...
Um beijinho

O Réprobo disse...

Querida Ana,
As execuções coloco-as noutro plano, pois lhes encontro uma finalidade de afirmação social contra os recalcitrantes.
As chacinas de cristãos na vertente meramente espectacular, sem nexo constatável à "fundamentação" da decisão imperial, as favelas visitadas de que bem nos recorda, outros espectáculos que proporcionam deleite na contemplação do sofrimento sem significado, sim, são indícios seguros da menoridade de certos homens.
Nunca esquecerei em Marrocos, o momento em que o guia turístico local nos levou a vsitar o que considerava uma atracção - velhinhas paupérrimas a carregarem fardos de lenha. E a revolta do meu Pai, resmungando sobre o homem pensar que éramos americanos, o que também poderá ser pouco justo, já que nem todos, espero, serão assim.
Beijo